tag:blogger.com,1999:blog-76013164093179955172023-11-16T04:35:13.986-08:00Na redeJornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.comBlogger240125tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-89938170933480101502020-05-30T15:32:00.000-07:002020-05-30T15:32:07.885-07:00O padre e seu legado<br />
<br />
Os meninos e meninas de Emaús o chamavam simplesmente de padre. Eles reconheciam a marca diferencial. Porque Bruno Secchi, um sardo que veio para Belém com vinte anos, recém ordenado, era principalmente um padre. Padre Bruno, era como os paraenses o conheciam. Um sujeito magrinho e pequeno, de rosto e maneiras calmas, que disfarçavam uma vontade férrea e uma coragem a toda prova, produtos de uma fé profunda.<br />
<br />
Ele chegou na barca dos salesianos de onde desembarcou no final do século passado, para tornar-se pároco ligado à Arquidiocese de Belém. Mas, tanto na Ordem como no clero regular, padre Bruno se colocou firmemente ao lado dos desvalidos, mirando principalmente os mais vulneráveis: as crianças e os adolescentes mergulhados na pobreza extrema.<br />
<br />
Começou com os pequenos trabalhadores das feiras e mercados: crianças que vendiam jornais, faziam carretos nas feiras, trabalhavam como ajudantes. Fez para eles um pequeno restaurante. Choveram contribuições e auxílios. Pouco a pouco, a iniciativa foi ganhando corpo: surgiu a República do Pequeno Vendedor. Arrecadações anuais de artigos usados na cidade permitiram a montagem de uma escola de ofícios. Em tudo isso, havia uma constante interferência: a violência contra as crianças e adolescentes.<br />
<br />
Padre Bruno cruzou as divisas do Pará: persistente, incansável, percorreu o país inteiro convencendo pessoas, políticos, empregadores e empregados, funcionários públicos e juízes da necessidade de lei especifica para proteger as crianças e adolescentes. Em grande parte o Estatuto da Criança e do Adolescente saiu de seus pensamentos e de sua persistência. O Brasil lhe deve isto. Nós lhe devemos isto.<br />
<br />
Sua coragem pode ser demonstrada num único episódio: policiais haviam tido um confronto com bandidos em Belém, e, na vingança pela morte de um colega, mataram uns tantos suspeitos e percorreram as ruas da cidade atirando e exibindo os cadáveres. O padre Bruno foi a única pessoa a levantar a voz contra a barbárie. Enquanto um milhão de habitantes da cidade se encolhiam amedrontados, ele foi às televisões e condenou, com palavras mansas, mas duras, o acontecido, forçando assim a correção de rumo.<br />
<br />
Padre Bruno morre aos 80 anos, naturalizado brasileiro; o Estado do Pará está em luto oficial por três dias; alguns milhares de adultos, que tiveram sua infância ou adolescência resgatada em Emaús, farão um luto mais duradouro. Algumas centenas de jovens não verão mais o sinal – o Padre – nos trabalhos cotidianos de Emaús. Mas o legado deste homem está fincado na história de sua pátria de adoção e na terra que ajudou a suavizar.<br />
<br />
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-4288932261936387242020-04-23T14:59:00.001-07:002020-04-23T15:02:10.893-07:00Sem silêncio (1)<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Cartas aos amigos<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Belém, Pará, 23 de abril de 2020.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Queridos amigos e amigas,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Dois motivos me levam a quebrar o silêncio que me impus
desde quando os pequenos cronistas saíram de moda e eu com eles. Sem leitores e
sem disposição para me tornar um <i style="mso-bidi-font-style: normal;">brainstar</i>,
de vez que prezo profundamente minha privacidade, decidi parar por ali mesmo,
alguns anos atrás.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Eu acreditava que a minha geração, aquela que lutou nos anos
de chumbo e, depois, nas diretas já, tinha cumprido seu tempo e que a hora de
agora é a de nossos filhos. Mas há momentos em que não é possível esperar pelos
outros. Há momentos em que os velhos como eu, depositários do que não deve ser
esquecido, precisam voltar para exercer sua função de transmissores: postar-se
em frente aos mais jovens e dizer-lhes, mesmo que não sejam ouvidos, o que deve
ser dito. Esta é a primeira razão.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
A segunda, ao contrário do que afirmam aqueles precipitados
senhores, de que as palavras não movem montanhas e não mudam realidades, a
humanidade tem raízes exatamente nela: no princípio era o verbo e no final será
o mesmo verbo, passando por Gilgamesh e abracadabra, por evangelhos e alcorões,
por ilusões e verdades. E eis a segunda razão: as palavras estão erguendo
muralhas odientas; são necessárias outras palavras para combatê-las. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
O primeiro discurso vem do século passado, meados do século
passado.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Um dia destes alguém me dizia que o abandono dos velhos na
pandemia do corona é fruto do neoliberalismo ou do capitalismo selvagem: quem
não produz, morre. Mas quem dera que essa fosse ideia nova! Milhares de pessoas
não teriam morrido nos anos 30 e 40 do século passado... Pois foram essas as
razões que guiaram o programa de eutanásia desenvolvido pelo governo Hitler na
Alemanha, iniciado em 1939 com... bebês. Esse programa não foi executado pela
Gestapo ou por outra organização da SS nazista. Foi executado por médicos. A
crueldade vinha revestida de misericórdia. Em nome da misericórdia, pois, foram
esvaziados os hospitais psiquiátricos diretamente nas câmaras de gás. Em nome
da misericórdia, milhares de crianças com deficiência física ou mental foram
mortas, a princípio por overdoses de remédio ou simplesmente de fome, mais
tarde, por asfixia. A mesma asfixia do coronavírus. Até agosto de 1941, 70.273
pessoas tinham sido assassinadas. Praticamente a capacidade máxima do Maracanã.
Até o final da guerra, em 1945, tiveram “morte misericordiosa” 230 mil pessoas.
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Esse programa foi o embrião do holocausto. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
O abandono dos velhos se inspira, pois, em puro nazismo. Que
não era capitalista, mas autocrático e escravagista. Tão autocrático e
escravagista quanto o regime stalinista.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Esse abandono já está crescendo e multiplicando-se: nenhuma
medida foi tomada para proteger as tribos indígenas, para as quais a simples
gripe é mortal, e um vírus como esse, genocida; nem as pessoas amontoadas nos
presídios. Himmler disse uma vez que, no interesse do país, “tirar a vida de um
homem não significará mais que tirar a vida de um boi” – ou seja, bandido bom é
bandido morto. Como um boi, ou pior que isso.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
“<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Quando um moleque de
9 ou 10 anos vai trabalhar em algum lugar, tá cheio de gente aí: 'trabalho
escravo, não sei o quê, trabalho infantil...'. Agora, quando tá fumando um
paralelepípedo de crack, ninguém fala nada. Então, o trabalho não atrapalha a
vida de ninguém</i>.” Isto é Bolsonaro, março de 2020. <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Arbeit macht frei (o trabalho liberta)</i>. Isto é a inscrição na
entrada do maior campo de extermínio nazista, 1941. Onde pessoas morriam
(também) de tanto trabalhar.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Coincidência ou consequência? A linha sutil da palavra
estabelece um cinismo comum de dois. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Obrigada pela atenção, da<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ana Diniz.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-1870818563689825662015-05-12T02:55:00.000-07:002015-05-12T02:55:02.094-07:00Complicações amorosas<br /><div class="MsoNormal">
Acabo de ler uma recente decisão proferida no Superior
Tribunal de Justiça distinguindo a categoria “namoro qualificado” daquela
denominada “união estável”. É parte, creio, da profunda transformação que a
família, enquanto unidade social, está passando, o que envolve, também,
diversas categorias de relacionamento a dois.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Recentemente soube de um par, gay, por sinal, com um
relacionamento de tapas e beijos de dez ou doze anos. Um deles adoeceu
gravemente - não era de Aids, diga-se – e
mandou o parceiro ir atrás de alguma pensão, herança, qualquer coisa que o
deixasse menos inseguro na pobreza deles. O parceiro ouviu do advogado que não
haveria nada para ele, a menos que casasse: dadas as características do
relacionamento, com cada qual levando a sua vida, eles seria considerados
apenas ficantes. Ficantes de dez anos, mas ficantes: os tapas interrompendo os
beijos não permitiriam sequer que fossem considerados namorados. E até o
casamento poderia ser contestado: a gravidade do estado de saúde do parceiro
poderia lançar suspeitas sobre a liberdade de sua vontade.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O ficante antecipa o namorado; pelo menos é isso que eu
encontro num “Guia para transformar ficante em namorado”, cheio de dicas: como
introduzir o ficante paulatinamente na sua vida, e como se introduzir na vida
dele; não se falsificar, porque os homens não gostam de comprar gato por lebre;
manter-se calma, controlando a ansiedade – e por aí afora. E antes da ficação
tem a curtição – nome novo para o antigo flerte, aquele arrastar de asa para a
figura querida, cheio de encontros deliberadamente casuais e de olhares
lânguidos. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ficantes fazem sexo, mas vão e vêm, cada qual seguindo a sua
vida. E depois temos os namorados. Na definição do STJ, namorados são os que fazem
planos. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Namorados podem ser simples, andar juntos o bastante para
fazer a célebre pergunta: no seu apartamento ou no meu? – isso, se tiverem
apartamento; caso contrário, rola motel, mesmo. E podem ser qualificados, caso
em que podem até viver juntos, morar na mesma casa, dormir na mesma cama.
Namorados qualificados, para o STJ, mantém um espaço próprio, independente do
parceiro, e pensam no futuro, até o planejam. Mas não efetivam a unidade
familiar: não estão juntos para o que der e vier, mas só para o que der; o vier
é outra conversa, depende de como venha. Pode acontecer de ficarem nessa
durante muito tempo, até a vida toda. Namorados, mesmo qualificados, não têm
direitos sobre os bens do parceiro: este é o preço da liberdade individual
mantida.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A próxima categoria é a do companheiro ou convivente: duas pessoas moram
juntas e compartilham tudo. Não interessa sexo – nem quanto ao gênero de cada
uma delas, nem mesmo se o fazem. O sexo, antes condição fundamental para a
constituição da família, passou a ser secundário. Interessa é se cuidam um do
outro, se têm conta conjunta, se decidem juntos o uso do dinheiro, a gerência
da unidade familiar: é a união estável. O convivente (esta palavra horrível substitui a beleza de
“amante”, que é como o povo chama quem mora junto sem casar) já é quase casado.
Mas, para se transformar em cônjuge
(outra palavra horrível) ou esposo (como chama o povo, com mais beleza e bom
senso), é preciso passar o papel, fazer o contrato, dizer sim para o juiz.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E é aqui que a jurupoca pia: depois deste longo percurso
entre o trinado do sabiá procurando a companheira e o papel passado diante do
juiz, às vezes vem um cansaço danado. O contrato de casamento, que remove a
precariedade da relação, muitas vezes acaba gerando um sentimento de
propriedade: minha mulher, meu marido. Vai daí que, como o que já se tem
raramente parece suficiente, a tentação de pular a cerca vem com a idade e com
o tempo de convivência. De vez em quando, o Romeu vira Casanova. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Nossa época transformou o singelo amor entre duas pessoas
num labirinto em que nem sempre o apaixonado consegue se localizar. E eu nem
falei aqui dos relacionamentos ditos abertos, da troca entre casais e dos
triângulos que podem se transformar em quadriláteros ou polígonos amorosos. Ou
da má fé, que cria atalhos e transforma o certo no incerto. E nem das
sequências temporais desses novos relacionamentos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Um dia destes assisti a este diálogo: <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<i>Ele</i>: Quem é essa pessoa? <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<i>A mulher</i>: Ela é filha do meu ex-marido. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<i>Ele</i>: Sua enteada? <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<i>A mulher</i>: Bem...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<i>Ele</i>: Ela morava com você? <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<i>A mulher</i>: N...não, nunca morou comigo. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<i>Ele</i>: Então não é sua enteada. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Captaram? <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-7803590319191866542015-05-02T18:20:00.000-07:002015-05-02T18:20:07.334-07:00Democracia<br /><div class="MsoNormal">
Desculpe-me o leitor a ausência, mas adoeci. E tudo o que escrevi nas
últimas duas semanas refletiu isso – crônicas rabugentas, impublicáveis. Foi
gripe, claro: o Ministério da Saúde ainda não conseguiu entender que o Brasil é
plural, e manda vacinas para cá sempre <i>depois</i>
do surto viral que bota meia Belém mergulhada em tosses e espirros.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Claro também que eu não vou tomar essa vacina, que é da
gripe passada. E como eu, muitas pessoas, embora depois as autoridades achem
que é mera resistência à vacina...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
De certa forma, têm razão: paraenses têm uma longa tradição
de resistência civil. A maioria de nós sabe que discutir com os iluminados é
dar murro em ponta de faca. Então não se discute – simplesmente, não se faz. O
calor úmido também favorece a inércia. E quem quiser tirar a pedra do caminho,
que sue.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas hoje eu quero escrever sobre algumas novidades que estão
chegando por aqui, embora com o atraso de sempre. No primeiro caso, quatro
meses de atraso: Tony Blair publicou o seu artigo no NY Times em novembro. <i>Is democracy dead?</i>, pergunta ele
titulando algumas laudas instigantes. No artigo, ele alinha constatações que
levam a uma tendência mundial por governos autoritários, para arriscar uma
explicação: há que ter eficiência, resultados objetivos das políticas
instituídas ou as pessoas vão buscar outros meios para consegui-los. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O segundo caso é mais recente. Exasperada, uma deputada do
PT acertou na mosca ao caracterizar o apoio a Eduardo Cunha de “bancada BBB”:
Bíblia, boi e bala. O ponto comum desse BBB é justamente o autoritarismo, a
força. Por Bíblia, aí, entenda-se não O Livro, mas a cartilha que saiu dele
para formar um eleitorado de cabresto, cumpridor de ordens, fechado em dogmas e
comportamentos padronizados. O boi representa o mundo rural do grande negócio.
E a bala, todo mundo sabe o que é que é. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
“É tempo de debater como melhorar a democracia, como
modernizá-la”, escreve Blair, para comentar que não basta um governo correto: a
decepção das pessoas se funda na falta de mudança em suas vidas. “O simples
direito de voto não é suficiente”, acrescenta. “O sistema precisa gerar
resultados para o povo”. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ora, se os brasileiros elegeram uma poderosa bancada BBB,
isto parece sinalizar que estão procurando o autoritarismo. É verdade que há
sempre uma margem de fraude nas eleições brasileiras, e, também, que a
circunstância eleitoral é localizada demais para apontar caminhos seguros.
Mesmo assim, há muitos indícios de uma tendência pelo que Blair caracteriza
como “a tomada de decisão eficaz por meio da liderança forte”: o descrédito do
Congresso, a banalização da violência, o desrespeito continuado a toda e
qualquer autoridade, o uso de fardas nos parlamentos, os protestos por qualquer
motivo interditando ruas e rodovias, prejudicando milhares de pessoas, a recusa
do cumprimento de ordens judiciais...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E há, sobretudo, a
corrupção disseminada e descontrolada. A soltura precoce dos condenados. Fichas
sujas em cargos ministeriais. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Estaremos nós procurando um novo salvador da pátria ou
simplesmente matando a democracia? <o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-52562522239567868982015-04-05T16:42:00.003-07:002015-04-05T16:42:51.652-07:00Dona Dilma continua...<br /><div class="MsoNormal">
Dona Dilma veio ao Pará com cara de quem cumpre um
compromisso um tanto quanto enfadonho, mas inadiável. Subiu no palanque e
desfiou promessas, como se em campanha ainda estivesse. E, como na campanha,
prometeu o que sabe de sobra que não vai cumprir.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Dona Verdade foi escorraçada para baixo do tapete - ou
talvez tenha se escondido, envergonhada, quem sabe? Pois dona Dilma disse que
vai construir 42 aeroportos no Pará (embora os paraenses estejam cansados de
dizer que o que querem, mesmo, é um aeroporto decente em Santarém, outro, se
possível, em Marabá, e segurança nos céus em todo o Estado). Entoou loas às
hidrelétricas (embora os paraenses estejam cansados de exigir o cumprimento das
leis ambientais, pedir pelamordedeus que a União não mate o rio Tapajós com a
garimpagem descontrolada e uma dúzia e barragens, leve a energia, mas nos pague
as dívidas da lei Kandir). E que vai construir alguns milhares de casas (embora
todo mundo saiba que os cortes de verbas não vão permitir isso; é bem verdade
que ela não disse quando vai entregar essas casas). E foi por aí. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Na plateia, ansiosos felizardos das casas populares, postos
no fundo. A linha de frente era feita de <i>cuteiros</i>,
para garantir o entusiasmo encomendado para as câmeras. No palanque, uma linha
de impedimento, pendurada em cartões amarelos de suspeitas e incriminações.
Dona Dilma estava de vermelho.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Dizem que Dona Dilma não é política. Eu acho que é. Ela
liquidou Marina, afastou o Zé Dirceu, acabou com Patrus Ananias, quando foi o
caso de substituir Lula. Engole sapos, escorpiões e elefantes. Dona Dilma é uma
política que adora o poder, e não está nem aí para razões outras que não sejam
exercê-lo. Por ele, ela até faz dieta.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Por isso, Dona Dilma dá ao Pará e à Amazônia a importância
justa da medida eleitoral. Ou seja, mínima. Pouco se lhe dá se, ao subir no
palanque paraense, o discurso atravesse o samba. Ela olha a Amazônia como um
território a explorar, a gordura a queimar, a riqueza a conquistar. Dona Dilma
só conhece um pedaço do Brasil, aquele onde cresceu e se criou, o pedaço que
fez sua cabeça. O resto é apêndice, regiões problemáticas para as quais alguma
caridade consola. Ela não olha para o futuro: depois de amanhã é longe demais
para ela.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Dizem que Dona Dilma está encurralada. Ah, não está, mesmo!
Quem quiser que se fie nas encenações da dupla Renan/Cunha. Ambos defendem a
própria pele: não se arriscarão mais do que lhes recomenda a prudência. Por
isso, Dona Dilma continua mentindo: pode ser cínico, mas é mais cômodo e semeia
dúvidas. A principal delas é a falsa ideia de “não é política, diz o que lhe
mandam dizer”. Dona Dilma sabe explorar muito bem essa imagem de marionete: até
agora ainda há quem ache que ela não sabia de nada dos bilionários desvios de
dinheiro no seu governo...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Pior para nós, mulheres. De forma subliminar, essa postura
da presidente reforça o preconceito de que mulher tem que ser conduzida ou
guiada por um homem. No caso dela, Lula. No que eu não acredito: Lula tem
carisma, mas usa o cérebro dos outros. <o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O problema é que mais dia, menos dia, Dona Verdade vai
conseguir fugir de sob o tapete onde a esconderam e confrontar Dona Dilma. Só
espero que esse momento não represente uma ruptura institucional. Sejam de
esquerda, sejam de direita, governos de força são sempre muito, muito ruins.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-28612324481225450762015-03-29T02:28:00.001-07:002015-03-29T02:28:49.900-07:00Dia a dia<br /><div class="MsoNormal">
<b>A síndrome de
Heróstrato<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal">
O termo foi criado por Albert Borowitz, da Universidade
norte-americana de Kent, como subtítulo de seu livro <i>Terrorism for self-glorification</i>. Heróstrato foi o grego que
queimou o templo de Diana, em Éfeso, cerca de 2.500 anos atrás, para que o
mundo se lembrasse dele pela destruição que provocou. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Parece que esse piloto que derrubou o avião alemão era
portador dessa síndrome, que reúne, numa só visão doentia, política e
sofrimento pessoal. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<b><br /></b></div>
<div class="MsoNormal">
<b>Dilma e seus
ministros<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal">
A presidente colocou um petista clássico no Ministério da
Educação, mesmo tendo que engolir críticas duras que ele lhe fizera duas
semanas antes. Talvez com isso consiga reaglutinar um setor tradicional do
petismo, ultimamente muito combalido. Talvez que sua “pátria educadora” consiga
uma nova imagem. Mas vai ser difícil, principalmente porque, para substituir o
ministro da comunicação social (escrever a verdade num governo de mentirosos é
pecado mortal) um sociólogo pós graduado em engenharia de produção, cuja maior
qualificação para o cargo é ter sido tesoureiro da campanha. Janine e Edinho já
começam devendo...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Já o ministro do Planejamento, ao discutir reajustes
salariais pedidos por funcionários, disse-lhes que “a sociedade clama pela
redução da folha de pagamentos”. Seria melhor se dissesse a verdade, que o
dinheiro existente tem outras prioridades.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<b><br /></b></div>
<div class="MsoNormal">
<b>Inflação chegando<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal">
Desaparecem as moedas divisionárias. Dia destes um
comerciante me deu um desconto de três reais numa compra de vinte, apenas para
ficar com troco miúdo. Também descobri que uma rede de supermercados dá 5 pães
carecas para quem trocar 50 reais em moedas. O desaparecimento das moedas é o
sinal mais claro de sua perda de valor. Outro sinal me vem do correio
eletrônico: dos 20 a 30 e-mails promocionais diários, passei a receber quatro
ou cinco. O terceiro está no supermercado: a batata ultrapassa os 5 reais por
quilo e o pão, 10.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Será que essa política econômica baseada no consumo espera
que os preços revertam por simples pressão de mercado?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<b><br /></b></div>
<div class="MsoNormal">
<b>A dívida da federação<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal">
A redução da dívida dos Estados e Municípios com o governo
federal é o confronto da vez. É, mano: farinha pouca, meu pirão primeiro. <o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-33419653930982699352015-03-19T04:46:00.001-07:002015-03-19T06:28:13.727-07:00Um olhar à direita<br />
<div class="MsoNormal">
Supreendeu-me ver, entre os muitos e variados vídeos e fotografias
das manifestações do dia 15 de março, um estandarte azul. Estandartes são
símbolos antigos; quem o usa, é tradicionalista e ultraconservador. Ou seja, é
de extrema direita.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Na mesma manifestação, em outro local, foi preso um grupo
autodenominado de “carecas do subúrbio”. Neonazistas... negros?! Este episódio
me surpreendeu mais ainda. Menos pelo paradoxo (Perdoa-os, pai, eles não sabem
o que fazem!), afinal, o nazismo é eugênico, e porque não pode ser negro?, que
pelo subúrbio, pela presença em redutos reivindicados pela esquerda. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ora, a extrema direita parecia ter sumido do cenário
político brasileiro. Mesmo assim, eu não deveria estar surpresa, porque nos
últimos anos tem havido indícios claros, cada vez mais frequentes, de um
ressurgimento: algumas prisões de “carecas”, depois de atos violentos; os
atentados contra mendigos, índios, meninos de rua; conteúdos cada vez mais
ousados em blogues; disseminação de terrorismo virtual. E, nas últimas
eleições, a votação recebida pela assim chamada “bancada da bala” apresentou um
poder de fogo razoável. Aliás, segundo os analistas, o resultado da eleição
parlamentar apontou um rumo de centro-direita para o país.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas uma coisa é a direita moderada, liberal, dos ACM e dos
Mainardi, e outra coisa é o fundamentalismo extremista que caracteriza essa
direita ultraconservadora. Ela é sempre violenta, intolerante, incapaz de
diálogo. Guerra é uma palavra que anda sempre presente em suas conversas. Se
pudesse, teria escravos... e às vezes tem, que o diga a Polícia Federal que,
volta e meia, liberta pessoas reduzidas a condição semelhante à do escravo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O fato de sentir-se segura o bastante para mostrar a cara,
apresentar de público estandartes e desafios, reivindicar claramente um golpe
de estado, demonstra que não está sendo tão repulsiva assim para muita gente.
Está conseguindo seduzir.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Qual é a sedução da ultradireita?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A solução pela força. A ordem unida, um-dois, um-dois. A
criação de uma zona de conforto, sem inquietações, porque sem críticas. A
abdicação das decisões e, portanto, uma falsa ideia de inocência. A supervalorização
do “nós” em relação a todos os outros “eles”. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A extrema direita sempre se fortalece quando há fraqueza
institucional. Sempre.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ela recrudesce os discursos quando há instabilidade. Ela
oferece o lenitivo da violência: elimine a oposição e a crítica e você terá
paz. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ela se baseia no discurso da superioridade e do egoísmo: não
queremos imigrantes por aqui; não queremos concorrência; não queremos
contradições. Não balance o barco. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ela é mortal. Ela mata o que atrapalha e, muitas vezes, quem
não pode se defender.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas ela não pode ser ignorada. Também não pode ser superdimensionada
(ela era minoria, bem minoria, nas manifestações). Tem que ter voz, para que
seja forçada a agir às claras. Tem que ser medida e acompanhada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Para contê-la nos limites que lhe proporciona a democracia é
preciso não alimentá-la. E, infelizmente, depois do que aconteceu no dia 15,
Brasília está lhe dando filés.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Primeiro, a presidente vai à tevê com uma atitude mais ou
menos assim: Eu sou humilde. Estou dizendo que sou humilde. Vai encarar? <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ela relembra sua luta contra a ditadura e presta homenagem
aos que morreram. Ela pode chorá-los, mas não os respeita: se respeitasse, não
permitiria que ladrões se apropriassem do país reconstruído. Se respeitasse,
demitiria os fichas sujas de seu ministério, antes de pedir ao Congresso que
vote uma lei para isso; afastaria de seu convívio pessoas suspeitas. Se
respeitasse, não permitiria as ameaças sobre a Petrobrás, nem mentiria na
campanha. Se respeitasse, não teria um projeto de poder, mas um projeto de
Brasil. Porque era este o projeto daqueles que morreram.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Segundo, o Congresso Nacional propõe um remendo político que
chama de reforma. E põe mais dinheiro nos partidos, triplica o fundo partidário
num ano em que é preciso reduzir, não aumentar, o gasto público. Pôs nos
partidos o que foi cortado nos investimentos indispensáveis. Quer fazer uma
maquiagem num sistema eleitoral ruim, posto sob suspeita nas últimas três
eleições. Quer fazer prédios anexos quando faltam estradas. Nenhuma discussão
sobre o fundamental: as prefeituras completamente falidas, situação de que nem
São Paulo escapa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Terceiro, o Supremo Tribunal Federal começa um jogo de cena
no petrolão. Acende o forno para a pizza. O país inteiro suspeita de Teori
Zavaski, mas não interessa: é esse
mesmo que vai por a mão na massa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O cidadão olha para Brasília e não vê saída alguma; ele
baixa os olhos para a rua onde está e enxerga o assaltante parado na esquina,
só esperando ele passar. Sua exasperação é exatamente o que a extrema direita
quer.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Então não há porque se espantar se negros, beneficiados com
a política de cotas (que eu, aliás, apoio integralmente) se apresentam como
neonazistas. Eles não são uns coitadinhos. Eles, como qualquer outro cidadão,
querem respeito e respostas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Que ninguém se espante, também, se esta crise se tornar mais
aguda, com cada vez mais frequentes apelos a um governo de força. Mas é preciso
resistir a essa sedução. É preciso ver os gulags que estão por detrás, os
efeitos da censura pelo tempo afora. É preciso ter sempre consciência que, para
quem ouviu o canto da sereia vem a morte cruel pelo afogamento. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E é preciso cobrar dos três poderes mais vergonha na cara.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-4515022173356728222015-03-15T18:47:00.000-07:002015-03-15T18:47:51.668-07:00O Brasil mudou, companheiros!<br /><div class="MsoNormal">
Metade da população brasileira faz parte da classe média
(renda individual mensal<i> </i>de 320 a 1.120
reais). Esta informação é do Data Popular e foi divulgada pela revista “Exame”
em meados do ano passado. A Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE apresenta
resultado semelhante: metade das famílias brasileiras tem renda entre 2 e 10
salários mínimos por mês</div>
<div class="MsoNormal">
.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Acostumados à fácil dicotomia ricos x pobres, muitos não
conseguem vê-la. Alguns intelectuais chegam a desprezá-la (uma vez, Marilena
Chauí desmereceu sua biografia ao chamar essa categoria de medíocre). Essa
classe média é tanto urbana como rural. Ela inclui o pequeno empresário
agrícola, o caminhoneiro autônomo, a esmagadora maioria de profissionais
liberais, o micro e o pequeno empresários, os assalariados com nível médio ou superior
e uma quantidade enorme de trabalhadores autônomos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ela não gosta de confusão. Trabalha duro, não entende nem
gosta de se meter em política e paga tudo de que se serve: hospital, escola,
serviços profissionais, empregados, alimentos, lazer, água, energia,
estacionamento, casa e todas as compras, além das tarifas de bancos e cartão de
crédito. E paga impostos, muitos impostos. Para ela não há isenção de IPTU, nem
de imposto de renda, nem facilidades outras. Ela está acostumada a pagar e a
cobrar. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E ela é emergente: foi só depois da estabilização da moeda
que ela conseguiu se firmar e fazer o que todo cidadão de classe média, no
mundo todo, faz: planos de médio e longo prazos, impossíveis quando a inflação
anda alta. A partir do real ela se consolidou, cresceu, e agora abrange 54% da
população.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Foi essa nova classe média que foi para as ruas, ontem. Os
manifestantes se reconheciam, pela primeira vez na história do Brasil, como classe:
havia alegria entre eles. Sua reinvindicação central, me parece, foi recuperar a
dignidade de ser brasileiro. Por isso, o ponto de união foi o Hino Nacional, o
verde-amarelo, a bandeira. A dignidade é
importante para a classe média: seus integrantes se sacrificam para ter uma
aparência limpa e bonita, para manter as contas em dia, para não se envolver
com polícia, para resgatar as dívidas e para não receber esmolas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A classe média se sente lesada, assustada e envergonhada.
Ela concordou com as políticas sociais, mesmo sabendo que financiava boa parte
delas; ela concordou com as políticas de quotas, concordou com as bolsas variadas
e diversas. Mas, volto a dizer: ela também está acostumada a cobrar. E, se paga
alguma coisa para uma certa finalidade, é para essa finalidade que o dinheiro
tem que ir. Então, pagar para que o dinheiro flua para outros destinos não é
com ela: a corrupção lhe dói no bolso como se fosse um assalto direto. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ela também está assustada com a possibilidade de descontrole
inflacionário. Ela sabe – todos sabemos – que aumentar insumos, como energia,
combustível e salários, forçosamente refletirá nos custos inflacionários. Que o
aumento do dólar não significa apenas custos mais altos em viagens, mas, e
sobretudo, num país que importa ou paga <i>royalties </i>por quase tudo o que usa para
mover suas máquinas, custos de produção mais altos, que refletirão no custo de
vida. A classe média é medianamente instruída e informada. Ela sabe o que move
a economia.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E se sente envergonhada pela escala de corrupção,
institucionalizada (como disse um dos delatores do petróleo), que se instalou
no país. Os gritos de “Fora, Dilma”, mais que tudo refletem essa vergonha, e
resultam da incapacidade da presidente de deixar de manobrar para acobertar os
ladrões.</div>
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Muitos articulistas têm insistido, na mal alinhavada defesa
do governo Dilma, que ela está pagando o preço de um compromisso com os pobres,
que é por defender os pobres contra os ricos que está sendo questionada; ou
que, como eu li ontem, foi o Brasil bem cuidado que foi para a rua; ou ainda,
como disse o infeliz ministro da Justiça, com temor refletido nos olhos, são os
que não votaram na presidente que a estão criticando. Fariam melhor se encarassem
de frente a verdade: que o Brasil tem uma poderosa classe média que não quer
ser mais sangrada para beneficiar ladrões; que essa classe média não é contra
políticas sociais, mas é contra a distorção dessas políticas, sua transformação
em garrotes eleitoreiros; que não é contra pagar impostos, mas quer esses
impostos usados corretamente. E que essa classe média é a metade dos cidadãos do país. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O Brasil mudou, companheiros. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E não será o governo propondo plebiscitos ou hipotéticos
pacotes contra a corrupção que vai conseguir sair da armadilha em que se meteu
com uma campanha mentirosa e ilusória. Até porque as manifestações da
sexta-feira, 13, mostraram claramente a solidão social do PT. Vai ter que
engolir a arrogância e negociar uma agenda concreta, clara, que precisa começar
com uma reforma tributária que aumente a capacidade de governo dos Estados e
Municípios, sem a qual não haverá reforma política que dê certo.<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-50381893252746741972015-03-08T03:31:00.000-07:002015-03-08T03:31:17.207-07:00Que moral, hem!<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O deputado Edmilson Rodrigues vai ser processado por quebra
de decoro parlamentar porque ousou, ousou! – chamar de moleque o eminente
peemedebista... como é mesmo o nome dele? Esqueci, que delito horrível! – no
aceso de uma discussão. Edmilson, um nortista, está sendo acusado de
“preconceito contra nordestinos”.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E o eminente peemedebista Renan Calheiros, presidente do
Senado, está sendo acusado de corrupção da grossa, mas, para o PMDB, não há,
aí, quebra de decoro. Nem sequer desconforto!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
“Mexa-se, mexa-se!”, cantou uma vez o menestrel Juca Chaves.
“Mas nunca tão depressa! Quem tem pressa come cru!”. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Parece que o PMDB não ouviu essa cantiga, ou se ouviu,
esqueceu. Apresentou-se em rede nacional não como governista, não como aliado
do governo, como seria o correto, mas como o próprio governo. Alinhou ministros
e promessas, arrotou grandezas morais e uma competência feita de <i>escolhas</i> e bem poucas realizações.
Precipitou-se, o PMDB: embora tenha abocanhado uma bela fatia da administração
federal, ele não manda nela. Suas <i>escolhas</i>
estão subordinadas à presidente que, apesar de ter ganho uma eleição de forma
mentirosa, e por pequena margem, é legítima. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Já tivemos presidentes do PMDB. Dois presidentes-viúvos, que
assumiram porque a cabeça do casal foi decapitada. Quer ter, agora, um terceiro
presidente-viúvo, porque só assim, meio que na sombra, é que chega lá. Mas de
José Sarney lembramos a inflação estratosférica que nos conduziu para o Collor,
com Itamar na vice. Collor decapitado, passamos para outro governo do PMDB. Itamar
não acreditava no plano real (pelo menos é o que consta do livro da Míriam
Leitão, que Itamar nunca contestou), permitiu seu lançamento porque não tinha
alternativa. Depois se opôs radicalmente ao seu sucessor, Fernando Henrique, o
ministro do real.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Em todos estes anos de democracia plena, vários partidos
apresentaram projetos consistentes: PSDB, PT, PPS, PCdoB, Dem, PDT. São
projetos divergentes entre si, baseados em ideologias diversas, até contrárias,
e utopias diferentes. Mas são partidos que têm perfil, sabe-se o que esperar
deles. Quanto ao PMDB, como o partido deixou claro no programa em que se
apresentou como governo, faz <i>escolhas</i>:
ora, quem escolhe, escolhe o já feito, não cria nem constrói nada de novo.
Limita-se ao que está ao alcance da mão. Ideias, propostas, e, como vemos
agora, dutos de dinheiro clandestino.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Pensando bem, talvez isso seja uma ideologia, a ideologia do
líquido que toma forma do recipiente que o contém. Se for assim, é uma
ideologia que se evapora quando sob o aquecimento das tensões. E, mesmo
contando com a força do vapor, basta instalar uma válvula, de preço, aliás, bem
variável, para ser controlada.</div>
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E talvez explique porque não se exija decoro de um senador
publicamente acusado de praticar diversos crimes contra o erário público (e
mais um, contra a inteligência e a boa-fé dos brasileiros), mas se queira
enquadrar o deputado do pequeno PSOL porque talvez tenha se excedido no
discurso. Digo – talvez – porque é bem possível que o deputado Edmilson
Rodrigues tenha simplesmente falado a verdade. E o deputado X (não há jeito de
eu me lembrar do nome dele!) seja mesmo um moleque. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
É, talvez o padrão ético do PMDB explique essa contradição.
E, sinceramente, não sei se um presidente do PMDB será melhor que uma
presidente do PT.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A lista de Janot e a decisão de divulgá-la, tomada por Teori
Zavaski (quem quiser que acredite que o Planalto não agiu nessas decisões) demonstram
que Dilma está longe de entregar os pontos. Se ela conseguir afastar Renan ou
Cunha da presidência de uma das casas do Congresso, enfraquecerá o PMDB o
suficiente para retomar a governabilidade ameaçada. Mesmo com as manifestações
de rua e a incômoda verborragia do ex-presidente Lula (que até agora não se
conformou de ser apenas um ex). Mesmo com o terrorismo virtual instalado pela
extrema direita e por um sem número de cidadãos assustados ou que se divertem
espalhando medo (só para dar uma ideia do que está acontecendo nas redes
sociais, dia destes recebi dois áudios ressuscitados de 1963!). Mesmo com uma
recessão em andamento. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Só que ela tem que ser rápida: falta uma semana para o 15 de
março e existe, graças a Lula, risco real de confrontação nas ruas. <o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-14652558498865839732015-02-22T02:27:00.000-08:002015-02-22T07:32:20.325-08:00A flor da Guiné<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Desde o dia em que saiu o resultado do desfile das escolas
de samba do Rio de Janeiro que ando matutando sobre a Guiné Equatorial. Que
bela flor viu lá o colibri carioca?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Tão bela e tão
perfumada que eclipsou qualquer preocupação, todos os desgastes e todas as
dificuldades para representar na avenida um país com 400.000 habitantes (dado
oficial da Embaixada da Guiné no Brasil, mas há quem diga que são mais, e
outros, que são menos), duramente marcado pela colonização, estigmatizado pelas
violações constantes de direitos humanos, com 77% da população abaixo da linha
da pobreza e descoberto por um navegador português chamado Fernando Pó.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
É, Fernando Pó. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Bem, a Petrobrás está lá. Ela adquiriu, em janeiro de 2006,
50% de participação num contrato de partilha de produção de petróleo (bloco L,
na bacia do rio Muni) operado pela Chevron, que perfurou dois poços que deram
em nada e, no ano seguinte, abandonou o bloco e o país. A Petrobrás continua
tentando, talvez acreditando que “é preciso mais que cinco poços secos para condenar uma
bacia.” Em 2009 o NY Times dizia que poucos países simbolizam tão bem a
corrupção e o nepotismo do óleo como a Guiné Equatorial e que as petroleiras
que trabalham ali estavam preocupadas com a imagem do país.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Bingo? Não sei, ouso pensar, mas não ouso opinar sobre isso.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas esse contrato que a Petrobrás assinou parece um pouco
com a história de Pasadena, não? O ano é o mesmo e a Petrobrás comprou mico nos
dois casos: na Guiné, comprou em janeiro uma participação de exploração de um
bloco que ia ser perfurado no mesmo ano; no ano seguinte, fica com um poço
seco... Toyin Akinosho,<b> </b>analista do Africa Oil+Gas Report, jornal
mensal dedicado à indústria do petróleo, comenta que a decisão de ficar, tomada
pela Petrobrás, talvez se deva ao fato de que os dirigentes de estatais não têm
a mesma responsabilidade que têm os das empresas privadas perante os
acionistas...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E de repente a Beija
Flor repete Fernando Pó e descobre a Guiné Equatorial. E ganha o campeonato. E
com certeza será convidada a se apresentar lá: bateria, mulatas, dirigentes da
escola e da Liga das Escolas de Samba. E voltará dizendo que o povo da Guiné se
entusiasmou tanto que todos pensam numa continuação por lá.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E Neguinho da Beija
Flor dá entrevista dizendo que é a contravenção que financia o carnaval
carioca.<o:p></o:p><br />
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E o governo da Guiné diz que foram as empresas, no papel de
animadores culturais, que financiaram a escola. Empresas ansiosas para melhorar
a imagem do país. Mas empresas que podem reunir alguns milhões de reais numa
vaquinha assim, informal, para financiar uma agremiação cultural cuja
importância se restringe ao Brasil, e uma vez por ano? E a responsabilidade com
os acionistas? Bem, se o acionista principal for uma viúva rica, é só seduzir a
viúva, não? <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ainda tentando descobrir a flor que encantou o colibri
carioca, leio, por meio do Trip Advisor, relato de viagens feitas a esse país.
Num deles, o viajante escreve: “Museus? Bem, a Air France tem voos diários”
para acrescentar que só a natureza, que ele qualifica de magnífica, é que oferece
o que ver. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Eu imagino o Pó navegando para descobrir a ilha de Bioko.
Visualizando alegorias e fantasias, com árvores de renda franzida e mulheres
seminuas. Fissurado depois da longa viagem por novos cheiros, que o façam
esquecer o que vem do interior das caravelas. Atraído pelo brilho da riqueza
negra.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O que o Brasil está fazendo com os africanos? Meu Deus!<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-1095398903340477202015-02-02T04:17:00.001-08:002015-02-02T04:17:54.122-08:00Brasil profundo<br /><div class="MsoNormal">
O Congresso é a cara do Brasil. É ele que espelha, física e
moralmente, o Brasil profundo, do litoral, do sertão e das cidades. Especialistas
políticos caracterizaram o Congresso que iniciou suas sessões ontem como de
centro-direita, com o avanço de das bancadas religiosas e da chamada bancada da
bala. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E esse Brasil mostrou a sua cara, ontem, ao eleger Eduardo
Cunha. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Infelizmente, não é a cara que eu gostaria de ver. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A cara que vejo hoje é enrugada por práticas corruptas,
hidratada pelos panos quentes postos sobre os escândalos, maquiada pelo
marketing irresponsável, enfeitada com ouro de tolo e com o olhar esquivo dos
trapaceiros.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ontem, o Brasil estendeu um tapete para tentar esconder o
lixo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas o Congresso se esqueceu que o lixo fede. A podridão se
impõe para muito além do ponto onde ocorre. E quando o lixo é muito, e é
antigo, faz escorrer chorume. O chorume contamina tudo o que toca, terra e
água. E também tapetes.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Na semana passada um título de jornal ilustrou essa
contaminação: dizia que o desvio na Petrobrás sustentaria o programa bolsa-família
por uma década. A leitura subliminar dessa manchete é a seguinte: esse dinheiro
que está no bolso deles devia estar no meu. O chorume toca, aqui, o
inconsciente coletivo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Cunha não fará oposição – aliás, ele declarou isso sem
subterfúgios – e sim, lado a lado com Renan Calheiros e Michel Temer, a
acomodação dos fichas sujas, sejam eles de que partido forem. Esse foi o pano
de fundo que garantiu sua eleição. O site “Congresso em Foco” informa que essa
é a bancada mais numerosa do Congresso. Em 2012, era composta por 191 deputados
ou senadores. Nas últimas eleições saíram 34 deputados e entraram 40 com
processos, em sua maioria por corrupção. Esse contingente de deputados
representa 18% da Câmara. Entre eles está o próprio Eduardo Cunha. E entre eles
não estão (ainda) os envolvidos nos desmandos da Petrobrás.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
No entanto, precisamos ter esperança. Num artigo publicado
neste domingo passado, Fernando Henrique coloca as suas no Judiciário. Em outro
artigo, despedindo-se da política partidária, José Sarney apela para a pressão
suprapartidária, a fim de evitar males maiores para o Maranhão. Lula, em vídeo
circulante na internet, grita pela mobilização do PT. Os três ex-presidentes, de
posições tão diferentes entre si, manifestam simultaneamente extrema
preocupação com o momento nacional. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas, para os parlamentares eleitores de Eduardo Cunha, que
reivindicam aumento das mordomias e das respectivas remunerações, a preocupação
parece ser somente a que mobiliza hoje o Brasil profundo: que fantasias usarão
daqui a duas semanas, no Carnaval. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Porque as fantasias de palhaço já têm donos: somos nós.<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-6647874959266685152015-01-25T02:02:00.000-08:002015-01-25T02:02:52.588-08:00O mundo dos ciborgues<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Eric Schimidt, diretor executivo do Google, previu na semana
passada que a internet, na forma como a conhecemos hoje, vai dar lugar a redes
interativas tão integradas aos objetos de uso comum que as pessoas vão deixar
de percebê-la. Ou seja: você manda, a geladeira obedece. Pode ser a cadeira,
também, ou sua própria roupa. Você poderá ter o mundo na palma da mão,
literalmente: projeções holográficas disponibilizam em seu corpo o planeta, ou
as pessoas do planeta.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas você não poderá agarrar o tempo que flui pelos vãos dos
dedos e responder assim à pergunta do poeta Cassiano Ricardo. E este é o
dilema, o problema, o xis da questão: integrado num sistema superveloz, é
impossível refletir. O <i>Homo Zapiens</i>
não pensa, apenas reage.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Esse termo, <i>Homo
Zapiens</i>, foi universalizado, a partir de 1999, por meio de um romance do
escritor russo Victor Pelevin (que talvez o tenha criado), como informa a
Wikipedia. De lá para cá, vários estudos acadêmicos foram publicados em torno
dessa nova condição humana, que consiste na hiperinformação e na
supervelocidade. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Se não há tempo para pensar ou refletir antes da resposta,
se ela deve ser dada em segundos – como fazem os atletas ou os comandos
militares de elite – ela será, necessariamente, um reflexo. Ela estará
integrada ao corpo da pessoa, resultado de treinamentos exaustivos, no caso dos
atletas e dos comandos, mas, no caso das redes informatizadas, decorrente do
próprio uso continuado. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Tenho claro que a maioria das pessoas não gosta de pensar,
de tomar decisões por seu arbítrio, prefere um manual – seja para comer, seja
para rezar, seja para estar em sociedade, seja para prestar exames de vestibular
(a quantidade de zeros na redação é um indicador claro disso). Não será
problema reduzir-se a um ciborgue, que são aqueles seres da mitologia moderna,
metade pessoa, metade máquina. Mas esta condição tem seu preço.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A primeira conta é a total impossibilidade do isolamento. A
segunda é o risco de todo manual: o erro que, no caso, conduzirá a desastres. A
terceira é o aumento brutal dos controles sobre as pessoas: se você é parte de
um sistema, está integrado nele, você não pode escapar de suas regras, por mais
contestador que seja. E a quarta é a antevisão de Huxley: a inteligência,
indispensável para o desenvolvimento humano, em ilhas, desdobrando os controles,
corrigindo o manual, para que todos sejam drogados felizes.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Estamos muito longe disso? Talvez, mas há muito tempo já as
pessoas se vestem da mesma maneira, mergulhadas num anonimato angustiante, e,
progressivamente, penduram-se cada vez mais nas redes. Cada vez menos fazem
coisas com as próprias mãos ou pensam pelas próprias cabeças. Um dia destes
atendi o telefone e era uma ligação de telemarketing. Diferente do usual, uma
voz eletrônica me disse: Esta/ ligação/ é para / o senhor / Marcos. / Se você/
é a pessoa indicada / tecle 1. /Se você / conhece a pessoa indicada/ tecle 2...
e assim por diante. Desliguei o telefone, naturalmente, com uma sensação de
raiva e choque. Raiva pelo menosprezo demonstrado pelo uso da voz eletrônica;
choque porque não imaginava que, nesta remota província do império brasileiro
já se pudesse ser objeto de uma intervenção dessas. Depois pensei que o mundo
globalizado não aceita mais a condição de “remota província”, porque a
geografia virtual é diferente da física. E que estamos nos tornando ciborgues e
nem percebemos isso.<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-53990379587901159652015-01-18T03:00:00.001-08:002015-01-18T03:00:37.522-08:00O atentado e os corvos<br /><div class="MsoNormal" style="text-align: right;">
<i>Cria corvos e eles te arrancarão os olhos </i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: right;">
<i><span style="font-size: xx-small;">(provérbio
espanhol)</span></i><o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Há um punhado de obras de arte que detesto. Nem por isso
lhes nego a condição de arte ou a liberdade de seus autores em produzi-las.
Nego-me eu a ler, ver, assistir, comentar. Há milhares de pessoas que, como eu,
também não gostam e há milhares que pensam de forma diferente. Mas liberdade é
isso: poder escolher.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Raramente aprecio uma sátira. Para mim, ela está perto
demais da grosseria. Também, pela mesma razão, não gosto do “Zorra Total”. Então,
desligo a tevê, fecho a revista, desconecto o assunto. O humor nu – nos
sentidos literal e figurado – não é a praia para onde eu vou.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A sátira frequentemente transborda do terreno do humor para
entrar no da ofensa pura e simples. Esse limite é cinzento: o que eu considero
limite não é o mesmo que o outro considera. O deboche muitas vezes beira a
crueldade. Discutir a intenção do autor é bobagem: o dano causado geralmente é
irremediável para o atingido. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mesmo assim, ser ofendido não gera um direito de vida ou
morte sobre o ofensor. Não depois que se estabeleceram princípios mundiais de
convivência e direitos humanos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E aqui chegamos ao cerne da questão: o que fazer quando um
grupo humano decide não aceitar esses princípios e, pior, tenta estabelecer o
seu ponto de vista sobre todos os demais?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Em termos de arte, chamamos isso de censura. Em termos
políticos, de extremismo. Em termos sociais, de radicalismo. Sabemos como
combater a censura, o extremismo, o radicalismo: pactuamos os limites na forma
de leis que todos devem respeitar. E discutimos esses limites o tempo todo, para
alterá-los por meio de novos pactos. Usamos para isso ferramentas legais: o
processo contra o autor de algo que nos ofende gera decisões que muitas vezes fixam
novos limites para o que se pode tolerar.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas, em termos religiosos, não há pactos: há dogmas. Dogmas
não se discutem: acredita-se neles ou não. Em clima de liberdade, um dogma não
deve se sobrepor a outro, e se um cidadão decide acreditar neste, e não
naquele, ou simplesmente não acreditar em nenhum, o religioso pode tentar
convertê-lo e, se não o conseguir, rezar pela sua alma. Não pode coagi-lo e,
muito menos, matá-lo. E esse é o problema do fundamentalismo religioso, que
matou Jesus Cristo porque negou a divindade de César, que dizimara, antes de
Cristo, os zoroastristas e, depois dele, continua matando até hoje. O
fundamentalismo é mortal. E é tentador: o nome de Deus é um formidável instrumento
de poder. Alguns milhões de mártires, de todas as religiões, atestam até onde
pode ir um crente desafiado. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Hoje, um grupo humano está retomando o fundamentalismo
extremo. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O atentado de Paris é café pequeno perto do que esse grupo
está fazendo na Nigéria, na Somália, no Iraque e na Síria, nestes dois últimos
países sob a fachada de Estado Islâmico. O massacre sobre muçulmanos xiitas,
assírios, cristãos armênios e yazidis (estes estão sendo exterminados) já conta
milhares e milhares de mortos. Centenas de milhares de mulheres de todas as
idades estão sendo transformadas em servas ou, pior, coisas: não dispõem nem de
seu corpo, nem de seu espírito.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E nós? Nós, olhamos horrorizados, assinamos petições,
passamos a conta para as potências senhoras da guerra e nos sentimos a salvo.
Mas – estamos realmente a salvo?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Dos jihadistas, provavelmente sim. Mas estamos nos
esquecendo de olhar em torno e ver aqueles que, de paletó e gravata, constroem os
ninhos dos corvos que nos arrancarão os olhos. Porque o fundamentalismo não
nasce da noite para o dia, nem de uma iluminação profética. Ele se alimenta da
intolerância cotidiana, do dia a dia da ofensa, da falta de limites, fermenta
no ódio e na ambição. E toma forma nas pessoas que usam o nome de Deus para
canalizar a intolerância contra os demais, demonizando os adversários – e o
demônio deve ser combatido, não é mesmo? E seus servos eliminados ou reduzidos
à sujeição total.<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
Tem-se falado em segunda guerra fria e coisa e tal. Mas a
História não anda em círculos, ela traça espirais ascendentes ou descendentes, cujas
curvas são semelhantes entre si, mas nunca iguais. O drama do século XX foi o
antagonismo entre diferentes ideologias; o do século XXI será o religioso, se
permitirmos que os corvos se criem.</div>
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-2267471516148978092015-01-11T02:18:00.001-08:002015-01-11T02:18:47.250-08:00Comunicação rápida, mas...<br /><div class="MsoNormal">
Como muita gente interessada, venho acompanhando de perto o
desenvolvimento do zap, e, a partir dele, das chamadas redes sociais,
geralmente saudadas como um grande instrumento renovador da comunicação. Para
mim, no entanto, é só um novo tipo de comunicação, com suas vantagens e
desvantagens. Está criando uma nova linguagem, quase criptográfica, em que os
símbolos e abreviaturas substituem boa parte das palavras. Não conseguiu ainda
vencer a divergência dos alfabetos, mas está caminhando para isso. É muito
rápida, mas...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
... as pessoas em breve descobrirão o que todo profissional
de letras sabe: quem escreve como fala está sujeito a um bom número de
incompreensões. Isto porque a palavra oral é acompanhada de vários outros
sinais corporais que reforçam e explicam os conteúdos. Uma sobrancelha
levantada que acompanhe uma frase dá o tom da ironia, da mesma forma que um
sorriso abranda um dito mordaz. No visor eletrônico a intenção se perde: então
é preciso mais cuidado com o que se escreve do que com o que se diz.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
... não há diálogo entre mensagens. Cada uma é unilateral:
você diz o que quer e lê se quiser. Ou interpreta como quiser o que recebe:
toda leitura é assim. Uma boa intenção mal redigida ou inoportuna pode ser
tomada como um insulto grave. E o insulto escrito sempre fica. É diferente da
oralidade, em que a pessoa pode se explicar ao perceber a reação do outro: na
mensagem, o outro está distante demais para explicações.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
... o poder gerado pela velocidade e aglutinação das
conexões é ilusório: parece grande, mas é pequeno. Dizer, mandar mensagens, é
fácil: difícil é convencer. O convencimento só ocorre pelo diálogo, impossível
no zap. Ao reunir pessoas na rua para uma manifestação, a pessoa que organizou
vai descobrir que elas vão lá por motivos próprios, muitas vezes bem diferentes
na ideia original, apenas para, digamos assim, aproveitar a oportunidade da
multidão. Isto porque o zap é apenas uma conexão rápida de indivíduos, não é um
partido nem um movimento político.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
... a informação é sempre superficial, limitada pelo próprio
meio usado. A mensagem só permite poucas palavras: então nada complexo pode ser
tratado nela. Não há discurso, há frases curtas, exclamações e só. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
... o zap nas redes sociais funciona em ondas ou em marés:
uma informação circula em alta velocidade e se quebra na praia. O efeito desta
onda é passageiro e, ao terminar, deixa uma impressão – não uma mudança. Marés
sucessivas podem alterar alguma coisa no litoral depois de algum tempo. Mas não
mudam o litoral todo, senão depois de séculos agindo da mesma maneira.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
... o zap se presta maravilhosamente para a intriga e para o
boato. Intriga e boato têm uma característica: são mais fáceis de fazer do que
de desfazer. No zap isto é mais difícil porque a impressão deixada pela onda
não é fácil de ser identificada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
... a intimidade na rede é falsa e, consequentemente, a
possível confiança entre integrantes também é. Isto porque a intimidade
pressupõe troca de contatos sensoriais: visão, audição, cheiro e, às vezes,
tato e gosto. Sem isso não se conhece de fato uma pessoa: pode-se conhecer apenas
o que ela diz. Muita gente está descobrindo isto da pior forma. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
... a comunicação é fragmentada, porque o meio usado também
é. Assim, a rede é ótima para fixar posições, dar rápidas informações ou
respostas. É péssima para explicar essas mesmas posições. Em última análise, a
rede é limitada ao sim/não. O que é apenas o primeiro estágio da comunicação,
porque não há discurso nem raciocínio cabíveis nela. Quem ousar fazer isso
estará perdendo tempo e ganhando fama de chato.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-69150308189629046072015-01-04T02:17:00.000-08:002015-01-04T02:17:16.919-08:00O pacto necessário<br />
<div class="MsoNormal">
<em><span style="background: white; border: none windowtext 1.0pt; color: #333333; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;"><span style="background-color: #fff2cc;">Os governos e
a Justiça estarão cumprindo os papéis que se espera deles: se punirem
exemplarmente os corruptos e os corruptores. (Discurso de posse da presidente
Dilma Roussef, 2015).<o:p></o:p></span></span></em></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; color: #333333; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; color: #333333; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";"><span style="background-color: #fff2cc;">Temperamental e desbocado como era, D. Pedro I por
certo daria um soco na mesa, acompanhado de meia dúzia de palavrões, ao ouvir
esta frase, mais de 180 anos depois de ter falado do trono, para a Assembleia
Geral Legislativa, abrindo a sessão de 1827:</span><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<em><br /></em></div>
<div class="MsoNormal">
<em>O governo necessita que esta Assembleia o
autorize, da forma como achar conveniente, para que possa estorvar a marcha dos
dilapidadores da Fazenda Pública, aos que não desempenharem bem os seus
empregos e aqueles que quiserem perturbar a ordem estabelecida por todos nós
jurada; já demitindo-os, já dando-lhes castigos correcionais. (Falla do Throno,
abertura de 1827 – Biblioteca do Senado. Atualizei a ortografia).<o:p></o:p></em></div>
<div class="MsoNormal">
<em><span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;"><br /></span></em></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">Nesse
discurso, um dos mais longos que fez, D. Pedro I ressaltou à Assembleia a urgência
da matéria: “</span><span style="border: none windowtext 1.0pt; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">um sistema de finanças bem organizado deverá
ser o vosso particular cuidado nesta sessão, pois o atual, como vereis do
relatório do ministro da Fazenda, não só é mau, mas é péssimo, e dá lugar a
toda qualidade de dilapidações. Um sistema de finanças, torno a dizer, que
ponha cobro, não digo a todos, mas à maior parte dos extravios, que existem, e
que as leis dão lugar a que existam e por isso o governo, por mais que
trabalhe, não pode evitar.</span><span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">”<i><o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNormal">
<em><span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;"><br /></span></em></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">Bem,
ele não conseguiu, assim, de primeira. Convocou mais duas sessões legislativas
ordinárias e duas extraordinárias, repisando a urgência e a necessidade de
arrumar as finanças públicas; não conseguiu nada. Finalmente, em 1830, deu o
soco na mesa: convocou uma sessão extraordinária com pauta específica para
discussão e foi assim que o Brasil teve sua primeira lei do orçamento.</span><span style="border: none windowtext 1.0pt; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;"> <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas foi somente com D. Pedro II, em 1847, que o imperador pôde
anunciar orgulhosamente que as receitas e as despesas estavam equilibradas, graças
a “judiciosas medidas”, e que brevemente começaria a reduzir a dívida interna.
As judiciosas medidas começavam pela vida austera do imperador que disse uma
vez:<span class="apple-converted-space"><span style="background: white; color: #252525; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.5pt; line-height: 115%;"> </span></span><em><span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">“</span><span style="border: none windowtext 1.0pt; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">Também entendo que despesa inútil é furto a Nação</span></em><em><span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">”. <o:p></o:p></span></em></div>
<div class="MsoNormal">
<em><span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;"><br /></span></em></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">Quase
dois séculos se passaram desde Pedro I e novamente o chefe de Estado coloca no
futuro a punição dos corruptos e corruptores. A burocracia multiplicou-se, as
leis, também. A monarquia constitucional deu lugar à República, que alternou
períodos ditatoriais e eleitorais – e a corrupção continua lá, plantada,
florescente, imbatível, no dizer da presidente, envolvendo<i> “</i></span><span style="border: none windowtext 1.0pt; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">todas as esferas de governo e todos os núcleos de poder, tanto no
ambiente público como no ambiente privado.</span><em><span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">”<o:p></o:p></span></em></div>
<div class="MsoNormal">
<em><span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;"><br /></span></em></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">Como
em todos os ambientes sociais existem núcleos de poder – poder familiar, poder
comunitário – de matizes e gradações diversas, vejo no discurso da presidente
uma generalidade inaceitável: somos cleptocratas, somos corruptos, todos!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">Eu
não aceito essa generalidade porque não é isso o que eu vejo todos os dias. Eu
vejo todos os dias uma multidão que tenta viver honestamente, que trabalha duro
e que paga suas contas. E que é furtado na prestação de serviços de telefonia,
eletricidade, transporte público; nos juros excessivos, tarifas bancárias não
explicadas, produtos enganosos; tem seu tempo furtado nas imensas filas de
cadastramento (a última do ano foi na Caixa, para inscrição em programa
oficial) ou nas filas de espera para qualquer serviço público. Eu vejo uma
multidão que tenta manter seu nome limpo de dívidas e que está exasperada
porque finalmente consegue ver para que bolsos está fluindo toda essa
ladroagem. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">Não,
presidente, não é de pacto que precisamos, é de rompimento: do rompimento de
seu governo com a corrupção que grassa à sua sombra. Não tente justificar isso
jogando a responsabilidade para a sociedade, para o povo, para nós. Comece a
senhora a luta: deixe de lotear ministérios alegando uma falsa governabilidade.
Só isso já bastaria para que a senhora pudesse anunciar, como D. Pedro II o fez
aos vinte anos de idade, o equilíbrio das receitas e despesas. Só isso já faria
o país acreditar que sim, é possível ultrapassar de vez a cultura dos extravios
que vem de tão longe.<i><o:p></o:p></i></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<em><span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;"><br /></span></em></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">É
a senhora quem precisa fazer um pacto com a </span><span style="border: none windowtext 1.0pt; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">res publica. </span><span style="border: none windowtext 1.0pt; font-style: normal; mso-bidi-font-style: italic; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">Rompa com a
corrupção, presidente, e descobrirá que os brasileiros preferem ser honestos.<i><o:p></o:p></i></span></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-76623012199383340582014-12-28T02:16:00.003-08:002014-12-28T02:16:54.687-08:00Em favor da utopia<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Entre o Natal e o Ano Novo, o tempo é de utopia, mais que de
festas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Porque estas duas invenções humanas celebram o nascimento e
o renascimento, ou seja, a esperança. E não há esperança sem utopia.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Conservadores usam a palavra utopia como um pejorativo com que
qualificam o que consideram impossível e até ingênuo ou ridículo. Mas,
frequentemente, têm que se render ao que achavam ser utópico: ao movimento
pacifista, por exemplo, à participação das mulheres na política, à
eletricidade... e muitas outras coisas que gente aparentemente sonhadora, mas
na verdade de muita fé, ousou construir.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A maior utopia, a da sociedade perfeita, onde todos vivam em
paz e harmonia, é buscada por todos: mesmo quem não acredita nisso tem um
pouquinho de esperança. E é esta esperança que faz com que todos façam votos de
paz neste período, mesmo se, no momento seguinte, insultem ou agridam. Um dia,
talvez... <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
É impossível chegar à concretização da utopia, porque haverá
sempre uma ambição a mais, um defeito a corrigir e, sobretudo, o fato de que a
utopia de cada um é diferente da dos demais. Há pontos comuns, é verdade.
Buscar estes pontos em favor da paz traz o sonhado para mais perto da
realidade.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Minha utopia, neste momento, é limitada, mas tão difícil
como qualquer outra: um 2015 melhor do que foi 2014. Sonho com isso porque não
vejo que vá acontecer; mas a dificuldade já é ruim em si mesma, não precisa ser
aumentada com terrores antecipatórios. Diante dos preços sendo reajustados toda
semana; do sumiço das moedas divisionárias, do troco; do estouro iminente da
bolha imobiliária com quebradeiras previsíveis; da possibilidade de perdermos
nossa maior estatal; da violência extrema em que mergulhamos; dos nossos times
de futebol em decadência – prefiro sonhar, sim, que de alguma maneira a
inflação será domada, a bolha imobiliária será emurchecida suavemente, a
Petrobrás resistirá, a violência diminuirá e nossos times encontrarão novos
caminhos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Haverá meios, por certo, que podem trazer minha utopia para
mais perto da realidade, inclusive ações que eu mesma posso realizar, e, assim,
agirei guiada por ela, o que me fará encontrar alguma felicidade no ano que se
anuncia ruim.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
E é isto o que desejo para todos: não desistam da utopia,
guiem-se por ela e gozem os relâmpagos da felicidade possível na dura travessia
do ano de 2015.<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-14505140967674281902014-12-14T03:18:00.000-08:002014-12-14T03:18:22.203-08:00Somos cleptocratas?<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Uma pergunta martelando na cabeça – porque o povo elege
determinadas pessoas mesmo sabendo que são corruptas – levou a outras
perguntas, estas feitas diretamente a eleitores que me declararam seu voto
nessas pessoas. As respostas tinham poucas variações: para alguns, o voto era
de gratidão por diversos tipos de ajuda recebidos (furar uma fila no sistema de
saúde, telhas para a casa ou bolsa de estudos para o filho) e, para muitos
outros, o voto se justificava pela expectativa dessa ajuda. Uma resposta,
entretanto, sintetizou tudo:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
- Todos eles roubam. Esse daí, pelo menos, dá um pedacinho
pra gente.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O que está claramente definido nesta frase é que o problema
principal para esses eleitores não é o furto da coisa pública, mas estar fora
da partilha desse furto. Secundariamente, a avaliação de que todos roubam é
apresentada como uma premissa, uma verdade inquestionável: quem não se
aproveita dos cofres públicos é tido como tolo e otário. Finalmente, a consideração
de que o voto é um bem de valor econômico definido na expressão “pedacinho”: é
um valor pequeno, flutuante, mas que pode ser perfeitamente negociado a fio de
bigode, isto é, na base da palavra dada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Este raciocínio é o mesmo que preside a planilha apreendida
na Queiroz Galvão, instrumento mais sofisticado, mas que igualmente transforma
a atividade política em bem de valor econômico. O “ProfPart”, que é a
disponibilidade de recursos, dentro da margem de lucro admitida para a
contratação de obra pública, para a doação a ser feita na próxima campanha
eleitoral para partido ou político, é o mesmo pedacinho, aqui transformado em
pedação matematicamente calculado, negociado a fio de bigode.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Entre o eleitor e a grande empreiteira está um enorme
espectro de governos municipais e estaduais, pequenas e médias empresas,
servidores públicos de muitos níveis. Neles pode ser encontrada com frequência “a
cota do deputado (ou do vereador)”, na contratação de obras; o “está sobrando
aqui, vou levar pra casa”, no material de escritório; o “use a merenda escolar
na confraternização”; o “vou asfaltar primeiro a minha rua, afinal sou
autoridade”; ou “o partido exige esta outra Secretaria; essa oferecida é
irrelevante, não tem dinheiro”; “os deputados estão insatisfeitos, isso aí não
dá para empregar os cabos eleitorais” – e assim por diante.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Parece-me claro que não é possível dissociar a atividade
política da atividade econômica, embora as Universidades façam isso sem nenhum
questionamento (por exemplo, ninguém trata de sindicalismo nos cursos de
economia e nem de macroeconomia nos cursos de direito constitucional). Mas o
Brasil não enfrenta o problema: prefere o caixa 2. Punhados de leis ditas
rigorosas, mas fora da realidade, são burladas diariamente, gerando uma cultura
que nos leva a conviver com a corrupção de forma natural.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Convivemos com dois preços: o “com recibo”, que inclui o
pagamento dos impostos, para toda a atividade profissional liberal; o “com nota
fiscal” e o “sem nota fiscal”, no comércio em todos os níveis, da padaria da
esquina à loja de luxo. A pesada tributação brasileira responde por uma parte
desse espírito sonegador, que é apenas um aspecto do caixa 2. Sim, porque é
preciso um pouco de habilidade para movimentar recursos sonegados. Eles são tão
produtos de roubo como quaisquer outros – o celular tomado no assalto ou os
centavos a mais cobrados pela operadora de telefonia. Mas essa tributação
exagerada não responde sozinha pela situação: a ela se alia a impunidade. A
Justiça brasileira é tão ruim que pune a vítima antes de punir o réu. O país
inteiro está vendo a diferença que faz um juiz – primeiro, Barbosa, e, agora,
Moro – quando ele resolve agir. Mas a infinidade de tempo usada nos julgamentos
anula boa parte do esforço e a existência de pesos e medidas diferentes,
conforme o réu, torna o Judiciário inconfiável. Os réus do mensalão já estão
fora da cadeia enquanto ainda penam, entre grades do Brasil inteiro, milhares
de presos sem julgamento. E, entre eles, quantos inocentes haverá? Dinheiro
(nem que seja para comprar a dedicação de um advogado) e prestígio político
(para pressões, naturalmente), fazem diferença, sim, no Judiciário. E, quando
isto acontece, está feita a terceira perna de sustentação da cleptocracia, o
governo baseado no furto.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Geralmente as cleptocracias funcionam na contramão da democracia:
com poucas exceções, tiranos e ditadores se apropriam da coisa pública com
naturalidade e reprimem duramente quaisquer discordantes. Mas parece que se
está gerando no Brasil uma outra forma de cleptocracia, a democleptocracia, em
que há um pedacinho, ou pedação, para cada um no caixa 2, com valor de mercado
sem o rigor matemático da Queiroz Galvão, mas perfeitamente definido. Em vez de
repressão, corrupção miúda – é menos traumático e sai mais barato.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O Índice de Percepção da Corrupção da Transparência
Internacional no colocou, em 2013, numa grande zona vermelha de corrupção, no
lugar 72 entre 177. Realmente é difícil perceber corrupção numa cleptocracia em
que o povo participa.<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-35466673888334405662014-11-30T03:49:00.003-08:002014-11-30T03:50:41.533-08:00Para que serve a campanha eleitoral?<br />
<div class="MsoNormal">
<div class="MsoNormal">
Não, eu não vou comentar o que todo mundo já sabe: que a
presidente Dilma está fazendo tudo o que na campanha disse que não faria. Mas
vou partir daí, desse fato, para, conjugando-o com outro – a natureza das
despesas de 4,92 bilhões de reais gastos nas campanhas eleitorais das eleições
de 2014 – abordar a pergunta que está no título desta crônica.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Na utopia brasileira, em grande parte expressa em
ordenamentos legais dissociados da realidade, a campanha deveria servir para
discutir as propostas dos candidatos. Deveria também ser um instrumento de
visibilidade dos candidatos, de forma a proteger as candidaturas de partidos
minoritários e levar ao cidadão o máximo possível de informação para que faça
sua escolha livremente. No caso de candidatos ao Executivo, deveria espelhar o
programa de governo dos candidatos que, apresentado à Justiça Eleitoral, baliza
a proposta do candidato.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
No entanto, a realidade é outra. Os programas de governo
depositados na Justiça não servem para nada – talvez como razão de impugnação
de candidatura se, por acaso, houver propostas contra as cláusulas pétreas da
Constituição, como divisão do país, por exemplo. No mais, são peças literárias,
desconhecidas até da equipe mais próxima do candidato. E não obrigam a nada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Os conteúdos da campanha giram em torno do que Miguel
Wiñazki chama de “notícia desejada”, ou seja, diz-se o que o eleitor quer
ouvir, pouco importa seja real ou não. Os recursos cinematográficos permitem a
criação de um mundo de ilusões, onde o que é feio é trabalhado para ficar horrível
e o bonito, lindo. Nesse mundo ilusório, em que o horário eleitoral se
assemelha à novela das seis, com trama superficial e mudanças abruptas do rumo
da história, o tempo a ser usado se torna crucial, e, aí, a distribuição de
tempo na tevê (ferramenta criada, aliás, para proteger as candidaturas de
partidos minoritários) provoca o primeiro movimento para as coalisões
majoritárias: não é o ajuste temático que reúne os partidos nesta ou naquela
chapa, mas o agregado de tempo na tevê. Então, considera-se natural que um
partido como o Democratas, que defende muitas bandeiras que o PT repudia, se
junte a este numa coalisão eleitoral. É nessas coalisões que começa a
verdadeira campanha eleitoral que, ao contrário do que quer a lei, passa bem
longe do programa apresentado. Na realidade, na organização do tempo de tevê
monta-se um time. Esse time vai disputar um campeonato, cujo troféu é o governo
e sua base legislativa. E daí em diante, joga-se – para a torcida, que, sem
ela, não há renda no campo de futebol nem votos na urna.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Quem ganha, leva. Se trapaceia, ou se, como aconteceu com
Vanderlei Lima nas Olimpíadas, um fato estranho impediu alguém de ganhar, não
interessa. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas, entre a composição do tempo da tevê e o final do
campeonato há um bocado de dinheiro fluindo dos bolsos de uns para os bolsos de
outros. Esse dinheiro vem dos impostos,
por via do chamado Fundo Partidário; e de particulares, quer sejam empresas,
quer pessoas físicas. Os R$4,92 bilhões que circularam este ano, foram parar
aonde?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Diz reportagem do portal UOL, da “Folha de São Paulo”:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<i>A disputa eleitoral que teve a maior quantia de gastos foi
ao cargo de deputado estadual (1,2 bilhão), da qual participaram 17 mil
candidatos. Na sequência, as que tiveram mais despesas foram para os cargos de
governador (R$ 1,1 bilhão) e de deputado federal (R$ 1 bilhão). Os gastos em
publicidade representaram metade do total investido pelos candidatos na disputa
eleitoral deste ano, seguidos por despesas com pagamento de pessoal e com
custos de transporte.</i><o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O que são os “gastos em publicidade”? Na campanha padrão, cujo
espelho está nas prestações de contas feitas à Justiça Eleitoral, são as despesas
com produção de materiais impressos (cartazes, santinhos, banners, panfletos, jornais),
peças para eventos (bottons, crachás, camisas, coletes, bandeiras) e,
sobretudo, para a criação de marketing e a produção de programas de tevê (se o
candidato tem uma produtora, ele vai ficar com a parte de leão do dinheiro da
campanha; não sai no prejuízo, em nenhum caso). Essas unidades empresariais
(agências de publicidade, marketing e relações públicas e as produtoras de tevê)
é que dispuseram dos quase R$2,5 bilhões usados este ano para os gastos em
publicidade, retendo consigo uma fatia que, segundo a tabela da Associação
Brasileira de Agências de Publicidade varia de 10 mil reais (para verbas
publicitárias empresariais de até 2,5 milhões) a 70 mil reais (para verbas
superiores a 25 milhões) mas que, numa campanha, é acertada levando em conta a
quantidade de candidaturas a ser atendida, o que deixa essa tabela como mera
referência. Ou seja: se a agência vai atender uma legenda partidária com 60
candidatos a cargos proporcionais e dois a cargos majoritários, ela pode cobrar
200 mil reais (60 mil correspondentes às verbas publicitárias considerando cada
candidato proporcional e 70 mil para cada candidato majoritário). O custo das
produtoras varia. Segundo a Cinemátika, empresa especializada na produção de
vídeos institucionais, um bom vídeo institucional custa de 15 mil a 40 mil
reais. Como a produção de vídeos de campanha envolve atores, filmagens
externas, uso de material cinematográfico e deslocamentos, vamos usar o máximo
valor para uma estimativa, embora, com certeza, sejam mais caros que isso.
Entre primeiro e segundo turnos, a campanha foi de 19 de agosto a 24 de
outubro, com um intervalo de dois dias, ou seja, 75 dias. A 40 mil reais por
dia, são 3 milhões de reais só para um candidato majoritário, só para uma
produtora de tevê.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Bem, então temos a primeira resposta para a pergunta do
título: a campanha serve para engordar as contas (ou fortalecer o setor, como
preferirem) das agências de publicidade, gráficas e produtoras de tevê. De si
mesmo, pagar as contas do mundo da mídia é justo e necessário. O problema está
no que esse mundo da mídia está oferecendo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Porque sem os vídeos a campanha seria quase inexistente, de
tão chata. O Brasil já fez essa experiência, no tempo da ditadura, quando a
campanha foi tão censurada que se limitava a um listão: foto, nome e número do
candidato. As audiências das tevês da Câmara, do Senado e da própria TV Cultura
mostram que o público não está interessado em debates, profundos ou não, sobre
o seu destino ou sobre as questões nacionais, regionais ou locais. Até porque
não entende a maior parte dessas questões - o jornalismo existe justo para
decodificar linguagens e conceitos e torná-los acessíveis ao cidadão comum. Nos
debates proporcionados pelas redes de tevê o jornalismo é engessado pelos
marqueteiros nas reuniões prévias (tempo igual, temas) transformando tudo numa
encenação casada com a ilusão produzida nos vídeos. O jornalismo impresso está,
da mesma forma, cerceado, algumas vezes por si mesmo, outras pelo entendimento
judicial sobre os crimes de opinião (escrever que um grileiro é grileiro pode condenar
um jornalista, que o diga o Lúcio Flávio Pinto). </div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Então, o que sobra? Motivação,
diriam os marqueteiros. A campanha serve para motivar o eleitor.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Sinceramente, é muito dinheiro para tão pouca coisa. Afinal,
na forma como está, a campanha eleitoral não serve nem para que se identifique
quem é candidato a deputado. Quem quiser esta informação que consulte as listas
da Justiça Eleitoral. A campanha não compromete o candidato, não informa quem
são os candidatos, não se ancora na realidade e se limita a dizer o que o
eleitor quer ouvir, o que pode ser resumido numa única frase: meu time é melhor
que o teu.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Ainda sinceramente, acho que quem defende que o Tesouro
Nacional pague as campanhas eleitorais não sabe do que está falando ou está
falando de má fé. Eu, pelo menos, não quero que minha cota de impostos vá
financiar um mercado de ilusões eleitorais. Também não resolve proibir as
empresas de contribuir para a campanha – o que é normal em todas as democracias
– porque será inócuo. Elas o farão de forma indireta; há milhares de meios de
fazer isso. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
Para que as campanhas eleitorais sirvam para algo mais que
gerar um mundo de ilusão destinado a um campeonato, o caminho é outro. Passa
pela mudança na distribuição do tempo na tevê, na liberação do jornalismo das
peias em que está hoje, na substituição da exigência de um programa de governo
pela identificação de princípios e diretrizes programáticos obrigatórios, cujo
descumprimento possibilitasse a responsabilização do candidato. E passa pela
liberação da propaganda de rua. Por acaso, o povo também tem o direito de se
manifestar.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
</div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-25292106344731178962014-11-15T02:17:00.000-08:002014-11-15T02:17:58.549-08:00A tarefa mais importante<br />
<div class="MsoNormal">
Alexandre Grothendieck morreu há dois dias. Ele era um
cientista – daquela linhagem muito especial de cientistas que não se limitam à
sua disciplina, mas alcançam a filosofia por uma via própria, longe da
formatação universitária. Um dos mais importantes matemáticos do século XX, que
redescobriu sozinho a relação entre a circunferência e seu diâmetro aos 11
anos, num campo de concentração nazista, queria que o esquecessem – mas, como?
É dele o trecho que transcrevo a seguir, em tradução livre. Foi escrito para
uma conferência em Paris, em junho de 1970, sob o título “A responsabilidade do
cientista (<i>savant</i>, no original) no
mundo de hoje”. E transcrevo porque se aplica ao Brasil de hoje e porque
acredito que essa responsabilidade, se é principalmente dos acadêmicos, é
também de todos e cada um neste momento brasileiro:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<i><br /></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i>Questiona-se por todo
o mundo os diversos perigos que ameaçam esta ou aquela comunidade humana,
grande ou pequena. No ocidente capitalista é o espantalho do “perigo comunista”
que ameaçaria a liberdade da pessoa e os valores de uma certa cultura burguesa
(...). Às vezes acentua-se o “perigo asiático” (já um dos motivos recorrentes
do hitlerismo antes da guerra) ou o “perigo amarelo” que ameaçaria a herança
cultural do ocidente. (...) Nos países comunistas invoca-se o “perigo
imperialista” que ameaçaria as conquistas do proletariado. Outros “perigos”,
por serem mais localizados, não deixam de turvar menos a consciência de uma
fração não negligenciável da humanidade, e servem de motivação ou pretextos
para muitas injustiças e crueldades: o “perigo negro” na África do Sul ou no
sul dos Estados Unidos, o “perigo sionista” nos países árabes ou o “perigo
árabe” em Israel, para citar alguns.<o:p></o:p></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><br /></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i>O observador desse
novelo de “perigos” complementares, aparentemente bem específicos e mutuamente
contraditórios, não pode deixar de ser atingido por sua extraordinária
semelhança de fundo, e a identidade deveria dizer-lhe: em cada caso é sentida e
denunciada como “perigo” a existência ou expansão (efetiva ou imaginada) de um
grupo humano percebido como diferente do grupo de origem, seja esta distinção
de ordem religiosa, linguística, étnica (“racial”) ou econômica, ou política
(i. e. concernente à organização da sociedade). <o:p></o:p></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><br /></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i>(...) <o:p></o:p></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><br /></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i>Pode-se chamar, por
oposição à tendência “atávica” que acabamos de descrever, a tendência
“racional” ou “ética” nas relações entre os grupos. Na sua forma mais evoluída,
ela resulta no conceito de solidariedade essencial entre os seres humanos,
quaisquer que sejam os grupos a que pertençam, conceito que pode ser encontrado
já em antigos pensadores, anteriores à nossa era (p. ex. Lao Tse, Buda, e
outros). O aparecimento dessa tendência “racional”, preliminar indispensável à
formação de sociedades civilizadas, deve sem dúvida ser vista (juntamente com a
linguagem) como a conquista mais importante do espírito humano – conquista que
está longe de ser completa, como acabamos de ver. Deveria ser possível, numa
abordagem dessas, ver a história da humanidade como a história da luta até
agora incerta entre essas duas tendências opostas nas relações entre os grupos
humanos. <o:p></o:p></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><br /></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i>(...)<o:p></o:p></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><br /></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i>Por esta razão, a
tarefa mais importante e a mais nobre que se coloca para os homens é a
liquidação deste reflexo ancestral, e a plena realização da solidariedade
inelutável que liga entre si todos os homens, quaisquer que sejam os grupos
humanos aos quais pertençam.<o:p></o:p></i></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
*****</div>
<div class="MsoNormal">
Para saber mais sobre o pensamento (ou, quem sabe!, a
matemática) de Grothendieck, procurar por <i>Grothendieck
circle</i> na internet. Lá estão depositados seus principais escritos, entre os
quais a conferência de onde foram retirados os trechos transcritos.<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-39483680085328193532014-11-09T00:16:00.000-08:002014-11-09T00:16:00.598-08:00De reforma e de chacina<br /><div class="MsoNormal">
No final do segundo turno das eleições a Folha de São Paulo
publicou um mapa relacionando votos e renda média municipal. De si mesmo, esta
relação não significa nada. Mas trouxe para discussão o grau de dependência das
populações para com as transferências diretas da União (previdência social,
bolsas e auxílios) e revelou, pela primeira vez de forma fácil, a brutal
pobreza das populações da Região Norte. Só para se ter uma ideia, a renda média
municipal em Belém é pouco superior à menor renda média municipal no Rio Grande
do Sul e menos da metade da renda média municipal de Porto Alegre.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Depois, muito se falou sobre país dividido. Sobre voto
atrelado. Sobre população pobre e população rica. Sobre nordestinos e sulistas.
Sobre preconceito. Mas, cuidadosamente, políticos e jornalistas evitaram a
questão principal: o modelo de arrecadação e distribuição tributária. Este
modelo, implantado na ditadura, despeja nos cofres da União 70% das receitas e
nas costas dos estados e municípios 70% das despesas constitucionalmente
obrigatórias. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Essa repartição de receitas está na base da incapacidade das
prefeituras em resolver problemas, é o poço de onde os Estados tentam, em vão,
sair, responde pela brutal pobreza das populações das regiões não
industrializadas, torna o Norte cada vez mais periférico do Brasil. Os
municípios cada vez mais dependentes da boa ou má vontade do governante de
plantão. As populações penduradas na corda bamba da previdência e dos auxílios
federais.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Na outra ponta, o excesso de dinheiro na União cria
distorções terríveis. Eu penso nisso quando constato que Itaipu paga 22 mil
reais por mês para cada membro do seu Conselho de Administração, que se reúne
uma vez por semestre – e nós, nortistas, acabamos de receber um tarifaço na
energia. Quanto à corrupção, nem é preciso comentar. Os bilhões desviados
tornam incongruentes as denúncias formalizadas contra gestores municipais que <i>merendaram</i> alguns milhares de reais...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Agora se estabelece uma perfunctória discussão sobre reforma
política. Escreve-se sobre plebiscito e referendo, como se isto fosse
fundamental. Mas sem uma reforma tributária verdadeira qualquer reforma
política será um simples remendo em pano velho: mais buracos no tecido. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Buracos como os de bala que se alojaram nas vítimas da noite
de terror vivida em Belém. Eu não compreendo porque o que está evidente – Belém
está mergulhada na guerra suja do tráfico de drogas – não é dito. Talvez porque
não haja solução possível, a curto prazo, para resolver o problema, será? </div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A
defasagem entre o tráfico (que usa endereços ocultos na rede Tor, na internet,
para a venda de drogas, redes sociais e <i>black-blocks</i>
para espalhar o pânico), e o aparato policial, retido no tempo em que as rondas
motorizadas eram o máximo de eficiência possível, é tão brutal como a nossa
pobreza. E essa brutalidade transforma em banalidade o assassinato a sangue frio.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A mentalidade formada na ditadura recomendaria “o controle
das redes”. Mas o que resolve é a inteligência no uso delas. Usar a
inteligência demanda mais do que coletes à prova de balas e pistolas: envolve
acesso a tecnologias e, sobretudo, mudança de métodos e práticas, a qual não
acontece milagrosamente nem por acaso. É fruto de um esforço complexo em que a
renda média da população tem papel importante: é preciso ter esperança no
futuro para dar valor à vida, arriscá-la menos. Sair da máxima pobreza com um
só salto, mesmo que se corra o risco de levar um tiro mortal nesse salto, é
tentação forte demais para quem não tem perspectivas, mas tem coragem. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Devolver a renda dos estados e municípios, usurpada na
ditadura, é também devolver essa esperança e permitir a inteligência. <o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-28373186550769150852014-11-02T03:29:00.001-08:002014-11-02T14:13:24.974-08:00Me esqueça!<br />
<div class="MsoNormal">
Circula no Judiciário uma boa quantidade de processos
movidos por pessoas que querem tirar dos <i>sites</i>
de busca informações sobre si. Geralmente deslizes, devida ou indevidamente
gravados; ataques pessoais; críticas e até calúnias. Alguns têm obtido medidas
favoráveis. Mas elas são puro paliativo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Porque as pessoas não esquecem. Esquecer é morrer: a humanidade
é o que é porque tem memória, aprende e transmite, mantém um processo contínuo
de acumulação de experiência que lhe permite a sobrevivência e a vida cada vez
mais longa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Na Roma dos imperadores havia uma disposição chamada <i>damnatio memoriae</i>, a condenação da
lembrança, aplicada a todos os que eram considerados supercriminosos. Depois de
sua morte, geralmente por execução, apagava-se tudo o que se referia a eles:
raspavam-se moedas, quebravam-se estátuas, repintavam-se os quadros, riscava-se
o nome dos documentos, fossem estes de papiro, de pedra ou de bronze. Mas
controlar a memória é impossível: a imperatriz Messalina, sobre quem foi
aplicada a condenação, é ainda, dois mil anos após sua morte em 47, o
símbolo da sexualidade descontrolada. Três bustos feitos em pedaços e
recompostos por diligentes arqueólogos restauram seu rosto, com razoável grau
de certeza. O esquecimento póstumo talvez fosse até benéfico para ela e imagino
que, se essa adolescente mãe de dois filhos tivesse vivido mais duas décadas,
tentaria apagar o seu passado. Se vivesse hoje, tentaria tirar da internet no
mínimo a encenação de casamento que foi a causa próxima de sua morte.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Trago este assunto hoje porque volta à discussão e às pautas
de noticiário mais uma tentativa de controle dos conteúdos da internet, uma
nova roupagem para a antiquíssima luta entre a liberdade de expressão e a
censura, ou, como querem os mais moderados, entre o dizer e seus limites. Não
adianta. A China fez isso e gradativamente está perdendo a batalha.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O boato, que circulava ao pé do ouvido, hoje trafega em alta
velocidade pelo <i>whatsapp</i>. Continua
sendo um boato, com as consequências de qualquer boato, que podem ser resumidas
em dois ditados: “onde tem fumaça tem fogo” e “em tempo de guerra boato é
fato”. Claro que a fumaça pode ser de gelo seco, não de fogo; e que a maioria
dos boatos não se torna fato, sequer cria fatos novos. Mas em tempo de guerra, com
a censura atuando a pleno, boato é fato, mesmo: quando ninguém sabe com certeza
do que está acontecendo, é melhor se prevenir...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Há pessoas que, despreocupadas como o foi Messalina,
revelam-se completamente para os usuários dos canais de comunicação. Nudez de
corpo e nudez de alma. Muitas delas estão na justiça, agora, tentando conseguir
para si o esquecimento que os imperadores romanos impunham aos que consideravam
de exemplo danoso ao império. Melhor fariam se fossem contidos em seus atos e
dizeres. O Estado não é instância adequada para proteger imprudentes: basta um
pezinho para ele, e ele ocupa o corpo inteiro, ou seja, um simples precedente é
suficiente para instaurar censura. E a censura é o mal maior.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Quanto à calúnia, existem medidas legais contra ela desde
que sistemas jurídicos foram instituídos. Mas na raiz da calúnia está a
maledicência e esta nada nem ninguém seguram: acredito que os hominídeos já
grunhiam condenações entre si e processos do que hoje se chama “desconstrução
de imagem”, eufemismo para a maledicência objetivamente aplicada, que desdobra
falhas alheias até o ponto do insuportável, induzindo a calúnia, podem ser
encontrados na Bíblia, entre outras memórias humanas. <o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O curioso disso tudo é que a maioria das pessoas é esquecida
sumariamente duas gerações após sua morte. Pedir para ser esquecido antes de
morrer apenas antecipa o que fatalmente acontecerá – e dos atos e dizeres
praticados restará apenas o que a humanidade julgar necessário para seu
aprendizado.<o:p></o:p></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-72519028891258960662014-10-26T03:56:00.001-07:002014-10-26T03:56:42.541-07:00A cara do Brasil<br /><div class="MsoNormal">
Na salada de comentários sobre a campanha eleitoral que termina,
retiro dois ingredientes comuns aos partidários do amarelo ou do vermelho: a
catástrofe que acontecerá se o outro lado vencer; e a consideração de que esta
foi a campanha mais lamentável, nojenta e baixa de que se tem notícia.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A isto somo a minha experiência. Participando da política há
mais de 50 anos, do grêmio estudantil à UNE, do jornalismo ao PSDB, passando
pela ditadura, pela constituinte, pela oposição e pela situação, já vi boi voar
e gafanhoto dar leite. Há sempre quem preveja uma catástrofe na vitória alheia
e quem ache que a campanha foi suja demais. Não é a minha opinião.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Creio que o bem maior é a liberdade democrática e, nela, a
alternância no poder é essencial. Há países que mantém por décadas o mesmo
partido, ou o mesmo sujeito, na direção; nenhum deles tem boas histórias para
contar no final desses longos períodos. Às vezes, como na Alemanha, um
espetacular resultado econômico cobra seu preço; às vezes, como em Portugal, os
cravos se descobrem sem canteiros suficientes. Uma campanha eleitoral é um complexo
fenômeno sociológico com começo, meio e fim. O processo tem tantas variáveis e
tantas implicações que não se pode definir, como querem muitos dos que
escrevem, o que acontecerá depois. Há consequências, por certo. Mas muito poucas são
previsíveis.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Quanto à sujeira, o que vi nesta campanha só diferiu das
outras pela extraordinária abertura política proporcionada pela internet.
Milhares de pessoas – talvez isto chegue à casa do milhão – deixaram de ser
espectadores para interferir diretamente. Para mim, isto é uma novidade muito
boa: prepara terreno para o fim dos <i>donos
do povo</i>, aquelas pessoas que rotulam toda e qualquer opinião contrária ao
que pensam como antipovo. Ora, o povo é um ente abstrato e, assim, não tem
necessidades, nem demandas, nem interesses. Quem tem necessidades, demandas e
interesses são as pessoas e estas estão preferindo posicionar-se, usando
largamente os recursos do teclado e dos canais virtuais para dizerem exatamente
o que pensam, gostem ou não gostem os demais.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A boataria solta é típica e característica das campanhas
eleitorais. A novidade desta foi a velocidade de circulação. Desinformar e
destratar o adversário são instrumentos usados desde que Davi depôs Saul e tomou
o poder em Israel. A natureza humana continua a mesma. Desta vez, entretanto,
milhares de pessoas resolveram fazer o mesmo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Abro uma exceção para o que aconteceu aqui no Pará. Na reta
final da campanha tive a sensação de voltar às eleições dos anos 1950, nos
duelos entre “A Folha do Norte” e “O Liberal”, este então órgão oficial do PSD
e o outro ligado à UDN. Como agora, o jornalismo passava longe das páginas,
transformadas em coletâneas de ofensas e desinformação. Os nossos dois
principais jornais vão pagar caro, em descrédito, pela desconfiança que
incutiram nos leitores. A palavra na telinha do telefone ou do computador
desaparece fácil; a palavra impressa permanece.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Outro lamento faço para a Justiça Eleitoral, que está
jogando fora uma longa tradição: a de viabilizar com a máxima imparcialidade o
pleito. Espero que a postura censora que os juízes tomaram, a partir de decisões
e discussões no TSE (particularmente uma sessão em que os ministros deitaram
falação sobre como devem ser os programas eleitorais) seja apenas um surto
passageiro. As principais funções da Justiça Eleitoral são evitar fraudes, homologar
e fazer cumprir as pactuações entre as correntes políticas para que se faça a
eleição. Ela já se mete demais em regulações (muitas, prejudiciais aos partidos
pequenos) e, a continuar desse jeito, vai acabar inviabilizando a
multiplicidade essencial para equilibrar o radicalismo, caminho natural do
confronto entre os grandes partidos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas, no geral, essa campanha fugiu à regra porque foi emocionante:
não houve nenhum ungido de Deus, nenhum salvador da Pátria, nenhum polarizador
inconteste. Homens e mulheres discutiram o que quiseram e como puderam, fizeram
proselitismo, escolheram as virtudes e defeitos de candidatos sem mística
alguma. O Brasil mostrou a sua cara, essa é que é a verdade. E, se houve muita
lama atirada nessa cara, houve também um enorme esforço cívico, livre, leve e
solto, para decidir o caminho do futuro. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-50516400631284676432014-10-19T01:32:00.001-07:002014-10-19T01:32:31.631-07:00De parafuso em parafuso<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Não pude escrever nas duas últimas semanas. Tive que
enfrentar um maremoto de problemas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Retorno agora, saindo das voltas do parafuso pessoal para
constatar que as campanhas eleitorais para o segundo turno também estão em
parafuso.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Assisto entrevistas surreais: perguntas sem respostas e
afirmações sem perguntas. Retórica sem conteúdo. Puro palavrório. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Bate-boca sem debate. Fuxico. Um parafuso no rumo do lodaçal
formado por pedaços de inquéritos, confissões duvidosas, confusões deliberadas.
Rejeição contra rejeição: Kafka, o transgressor, gostaria disto. Ou talvez
constatasse que tudo o que imaginou e escreveu é pouco diante da fertilidade
brasileira, que transforma pau em pedra e esvazia palavras com uma inimitável
arte.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Bem, pelo menos há menor quantidade de promessas impossíveis
de cumprir, abundantes nas eleições passadas. Mas só porque o tempo de tevê é
limitado.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mesmo assim, os candidatos deveriam aprender com os romeiros
de Belém e de Aparecida a arte de barganhar com os santos por meio de
promessas. Os romeiros não prometem o que não podem cumprir. Quitam-se de
maneira fácil: manhã de caminhada com uma casinha na cabeça, dias de caminhada
na romaria a pé pelas estradas, períodos de esforço e sofrimento para agradecer
e pedir. Não devem, não temem. Sobretudo, não mentem para os santificados,
coisa banal nas campanhas eleitorais.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Este parafuso eleitoral não parece um voo. Parece mais uma
broca, como as da Petrobrás. Às vezes, a broca encontra petróleo. Às vezes,
gás. E, às vezes, apenas lama e água salgada. Pelo buraco aberto pela broca
jorrará o que a terra guardou. O que será que o Brasil guardou? Até agora, o
que vem saindo da perfuração, quer na tevê, quer nas redes sociais,
assemelha-se a uma catarse coletiva: o Brasil profundo despeja tudo o que
estava travado na garganta, dando voltas na cabeça, envenenando o cotidiano. No fundo do poço talvez haja uma boa surpresa.
Ou talvez mais lama.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Tenho esperança de que a experiência eleitoral deste ano
seja aproveitada para alguma mudança que melhore o sistema. Uma pequenina
esperança, apenas. O conjunto de políticos eleito para o Congresso nacional não
ajuda em nada esta esperança. Em sua maioria são pragmáticos senhores que não
costumam refletir. Uma representação correta do Brasil de hoje, em que leitores
são raros e espiadores, milhões; em que as escolas produzem, para cada
pesquisador, milhares de analfabetos funcionais. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Pode ser que esses pragmáticos senhores consigam identificar
boas surpresas quando o parafuso eleitoral acabar. Pode ser que, depois que a
broca despejou o lado negro do coração do Brasil, seja a vez da riqueza
aflorar. <o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
Se os romeiros acreditam nas graças e milagres, porque eu
não acreditaria também?</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-39338966521963261542014-09-28T02:09:00.001-07:002014-09-28T02:09:55.983-07:00Buraco Negro<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Talvez não haja retrato maior da ineficácia das leis ou da
impunidade brasileiras do que o panorama deste processo eleitoral em que mais
de duas centenas de candidatos, tanto para cargos executivos como para cargos
legislativos, respondem a processos por corrupção e crimes conexos, muitos já
condenados por juiz singular. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Já não é só Maluf quem, com a cara de pau que ostentou
durante toda a sua vida, encara desdenhosamente processos e instâncias
judiciais para, a cada eleição, postar-se como coringa em São Paulo, puxar
milhares de votos para as urnas e, de aliança em aliança, de composição em
composição, manter-se no topo do que Lula chamou de <i>zelite</i>, palavra que repito aqui para distinguir esse povo da
verdadeira elite brasileira.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O <i>site “</i>Congresso
em foco” trabalhou sobre os dados dos registros de candidaturas e encontrou 253
candidaturas indeferidas pelos Tribunais Regionais Eleitorais (no Pará são 20).
A maioria desses candidatos continua em campanha, exatamente como Maluf,
enquanto espera pelo julgamento no Tribunal Superior Eleitoral. É verdade que
eles são apenas 1% dos cerca de 25 mil candidatos registrados. Mas é verdade
também que os partidos os registraram porque são puxadores de votos: seus votos
engrossarão as legendas e não apenas no cargo para que concorrem, mas para o
restante da chapa. Se a candidatura for indeferida e o registro cassado, os
votos individuais para esse candidato serão anulados – mas os restantes valem. Beneficia-se
o partido e os demais candidatos que compõem a chapa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O que revolta é saber-se que, exceto o Partido Comunista
Brasileiro e o Partido da Causa Operária, que não registraram fichas sujas,
todos os demais partidos contam com esses duvidosos puxadores de votos. E que
eles puxam votos porque a Justiça Eleitoral é lenta demais, indiferente às consequências
de sua morosidade, que incluem afastamento de prefeitos no meio do mandato
porque somente dois anos depois é que a impugnação ao registro teve julgamento
definitivo. O registro de candidato duvidoso tornou-se um recurso de campanha
eleitoral válido – e isto contamina a democracia.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Pode-se dizer que predomina, no caso, o princípio constitucional
de que um acusado é inocente até prova em contrário. O problema é que a
aplicação desse dispositivo é seletiva, não vale para todas as pessoas: os
presídios estão cheios de presos temporários, que cumprem pena antes do
julgamento. Mas para a <i>zelite</i>, ele
vale. Para o partido que usufrui da fraude, ele vale. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
O outro aspecto dessa perversão eleitoral é o fato de serem
essas pessoas puxadoras de votos. Milhares de pessoas votam em Maluf a cada
eleição, centenas de milhares votarão nos fichas sujas. Eu não acredito na
inocência do eleitor contemporâneo, mesmo que ele vote numa seção lá onde Judas
perdeu as botas. Ele sabe em quem está votando e vota. Essa massa demonstra
claramente que não se importa com a corrupção ou, então, que não confia no
Poder Judiciário. Em qualquer das alternativas, aponta para um buraco negro - cuja
força gravitacional, como se sabe, absorve tudo o que está em torno - no espaço
democrático. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Parece pequeno, esse buraco, considerando-se a relação entre
o número de candidatos e o total de fichas sujas. Mas o verdadeiro tamanho dele
só se poderá saber no volume de votos que mereceram. E a questão que se coloca
é se queremos ou teremos que continuar tolerando essa distorção perversa.<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7601316409317995517.post-31360751427212167232014-09-21T02:41:00.001-07:002014-09-21T02:41:54.209-07:00Vale tudo<br /><div class="MsoNormal">
No dia 11 de outubro de 2012, o atual presidente do Supremo
Tribunal Federal, ministro Lewandowski, votou pela absolvição de Paulo Rocha.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Dois anos depois, neste mês de setembro, ele pede vistas do
processo de julgamento da impugnação da candidatura de Paulo Rocha, em que a
relatora votou pela manutenção da candidatura. Geralmente um ministro pede
vistas de um processo quando discorda do voto. O pedido parece estranho, pois –
o ministro terá suas razões para tanto, mas não se pode deixar de pensar no
acordo que fez com Renan Calheiros para conseguir um imoral aumento de irreais
34% na própria remuneração e na de seus pares do Judiciário. Uma espada na
cabeça de um senador governista é uma poderosa ferramenta de pressão.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Neste mesmo setembro Rayfran das Neves Sales, pistoleiro,
assassino da missionária Dorothy Stang, julgado e condenado a 27 anos de prisão
por esse crime, ainda cumprindo pena, é acusado de, em quadrilha, matar mais três
pessoas em local bem longe da penitenciária e preso. Com as bênçãos do
Judiciário, Rayfran, pistoleiro confesso, ficou trancafiado menos de 9 anos. No
dia 2 de julho de 2013 um juiz decidiu que ele era bonzinho o bastante para
cumprir o resto da sentença na própria casa. Ou seja, solto. Rayfran
acrescentou à pistolagem o tráfico de drogas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Um a um os condenados do mensalão vão saindo da cadeia,
inicialmente a pretexto de trabalhar fora, enquanto aguardam a tal prisão
domiciliar. Jornada puxada desse trabalho fora do presídio: de 8 às 18 horas,
com uma hora de intervalo para o almoço. Se alguém acredita que José Dirceu vá
fazer “pesquisa processual e de jurisprudência” num escritório de advocacia, 9
horas por dia, merece integrar o coro dos serafins que cantam no céu. Os
ministros do Supremo Tribunal Federal, Lewandowski à frente, alinharam argumentos
em juridiquês para não ficar tão mal assim com essas concessões – até porque os
réus do mensalão ainda não cumpriram um mínimo razoável da pena. Eles disseram
que a lei que exige esse mínimo razoável está fora da realidade carcerária do
Brasil. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Mas eles não conseguem ver que é esse pedido de aumento
salarial de 34% que está fora da realidade brasileira.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Pelo jeito, a época é de vale tudo (que agora tem uma sofisticada
sigla – MMA – para disfarçar sua velhice secular: os espetáculos de violência
existem desde a antiguidade conhecida, com mais ou menos sangue, e mais ou
menos espectadores, conforme a época e a propaganda feita). Vale tudo no
Judiciário.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
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Vale tudo na campanha eleitoral: uma voz ao telefone
atribuída a “a”, “b” ou “c”. Uma invasão patrocinada. “Pesquisas” distorcidas.
Desconstrução de imagem mesmo que seja pela via da calúnia. Incoerência. Engavetamento
de processo. Jornais partidarizados, atirando lama para todos os lados. <o:p></o:p></div>
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E, como vale tudo tanto no Judiciário como na campanha
eleitoral, eu poria as barbas de molho, se as tivesse, diante da urna
eletrônica, seus disquetes e a falta de acesso aos resultados por seção
eleitoral. Um boi de 34 arrobas pode passar voando entre o dedo do eleitor e o
computador central do Tribunal Superior Eleitoral...<o:p></o:p></div>
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Jornalistahttp://www.blogger.com/profile/16197881934657197887noreply@blogger.com1