segunda-feira, 19 de agosto de 2013
O lucro imoral do BB
Na semana passada a imprensa noticiou o que pode ser sintetizado pela nota da Exame.com:
São Paulo - O Banco do Brasil teve lucro líquido de 7,47 bilhões de reais no segundo trimestre, cerca de duas vezes meia acima do resultado positivo obtido um ano antes, impulsionado pela venda bilionária de ações de sua área de previdência, seguros e capitalização, BB Seguridade. O banco ainda anunciou dividendos de 2,177 bilhões de reais, ou cerca de 0,7769 real por ação, relativos ao segundo trimestre, que serão pagos em 30 de agosto.
Desses dividendos, R$1,8 bilhão serão pagos à União Federal, que detém 51% das ações. O Banco do Brasil festejou, o governo também.
Eles não perguntaram o custo social deste lucro bilionário. No capitalismo fordista que caracteriza este governo, a selvageria do lucro a qualquer preço não permite esse tipo de questionamento. Mas, embora o pragmatismo tenha sua ética, não é possível eliminar os fatos, e os fatos mostram que este lucro é imoral.
É imoral porque o Banco do Brasil é uma empresa estatal. Essa condição o obriga a considerar, juntamente com sua sobrevivência e rentabilidade, a sua responsabilidade perante qualquer cidadão – e não somente seus acionistas, pequenos ou grandes, funcionários ou não. Para conseguir seus 2,177 bilhões em dividendos, o Banco do Brasil sacrifica o cidadão, principalmente seus clientes, com:
- o conto do vigário dos títulos de capitalização, em que o pequeno investidor sempre sai perdendo. Há muito que especializados em investimento – pessoas, revistas, jornais e associação de consumidores – denunciam esses títulos. O Banco Central faz ouvidos moucos porque eles são uma mina de ouro para os bancos. A justiça se faz cega. E os bancos estatais reagem com o clássico “se todos fazem, fazemos nós também – é a regra do mercado”. É a regra do predador. A presa que se dane.
- o sucateamento geral do banco. O BB se apresenta como dispondo de uma imensa rede de caixas eletrônicos. Num dia normal, grande parte não funciona e no restante, grande quantidade funciona mal. Ir a uma agência do BB é estressante, operar com o banco é irritante: ora é o sacrossanto “sistema” o culpado, ora é “a regra do banco”, ora é simplesmente falta de vontade.
- o acordo com as administradoras de cartão de crédito. O cartão de crédito é empurrado para o cliente que em momento algum é consultado sobre o assunto: ele pode deixar o cartão inativo, claro, mas se o cartão for furtado... As operadoras de crédito são proibidas de enviar cartões não solicitados para as pessoas. Mas, pelo jeito, isto não vale para o BB, que não fornece mais cartão livre de bandeira para os clientes que têm conta corrente.
- a extrema agressividade da política de metas por agência, que atira o gerente sobre o bancário e este sobre o cliente com todos os recursos possíveis e imagináveis para reter o dinheiro, empurrar moeda podre e vender o mais caro. Para tanto, valem as “medidas de segurança”, que limitam os saques e pagamentos, o máximo de juros nos empréstimos, sem opção para o freguês, e operações casadas sem conta, realizadas discretamente e sempre negadas.
Eu poderia ir muito mais longe no rosário, porque os 53 milhões de clientes que o banco alega ter não estão rezando satisfeitos. Mas ainda quero acrescentar outra coisa: o que é, de fato, responsabilidade social, que não se limita a pingar água aqui e ali pelo Brasil, nem ensinar alguns milhares de pessoas a ler ou abrir as dependências de seu clube para alguns deficientes, ou ter umas poucas agências “verdes”, coisas que o BB apresenta como grandes feitos. A primeira responsabilidade social é respeitar o cliente, mesmo que isso signifique um lucro menor. Principalmente o pequeno cliente, aquele do interior do interior, que só conta com um posto de serviço do banco e tem os mesmos direitos daquele que, na capital, é recebido no ar condicionado.
A segunda responsabilidade social é o de líder do mercado, menos pelo lucro e mais pela abrangência e pelas garantias extraordinárias que conta para operar: suas práticas podem alterar as regras deletérias. Por exemplo: se o BB der aos títulos de capitalização regras justas e rentabilidade adequada, os outros mudarão também. Quando o BB, mesmo de nariz torcido, baixou os juros, forçou uma baixa de juros geral no mercado. Imaginem se tratar bem os seus clientes! Seria um deus-nos-acuda para os outros bancos!
Finalmente é o BB entender que, se conta com o meu apoio e o de milhões de brasileiros para continuar estatal, não é somente para entregar 1,17 bilhão de reais para o governo federal e cerca de 400 milhões para os investidores estrangeiros que participam de seu capital acionário num segundo trimestre de um ano qualquer. Não é para ser o primeiro do ranking e o que dá mais lucro. É, principalmente, para ser o banco da confiança de todos. O banco exemplar. O banco que todos querem e merecem: o banco do Brasil.
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