Era uma vez um coelhinho encarregado de distribuir ovos de
Páscoa.
Ele saltava e saltava, carregando uma cesta mágica que nunca
se esvaziava. Não era absolutamente um coelho bonito e fofinho, tipo cartão
postal. Tinha barbas e às vezes era confundido com um sapo. Mas era saltador,
ora se era, conseguindo escapar de todas as armadilhas colocadas pelos djins
que habitavam as campinas auriverdes e que insistiam em capturá-lo.
Djins, vocês sabem, são aqueles gênios que vivem
interferindo na vida das pessoas, às vezes para o bem, às vezes para o mal. Costumam
fazer desaparecer as tampas das vasilhas de plástico, de forma a deixar as
donas de casa irritadas e sem explicações; gostam de fazer com que apareçam
risquinhos nas latarias dos carros e somem também com o brinquedo favorito da
criança de dois anos, só para fazê-la chorar. Por outro lado, também desviam
seu pé do espinho no caminho e ajudam você a ter uma bela ideia para sair de
uma encrenca.
Os ovos que o coelhinho distribuía eram mágicos, e,
portanto, ilusórios. Criavam aparências de felicidade e a pessoa começava a
agir como se aquilo tudo fosse real, para sempre, mas a felicidade não se
sustentava e a pessoa tentava alcançá-la novamente de qualquer jeito e maneira,
o que acabava muitas vezes em violência. Os djins não tinham nada contra a
magia, mas acreditavam também em limites, e o coelhinho conseguira passar todos
eles: os ovos que distribuía estavam levando aquele povo á beira do desespero o
que, como vocês sabem, conduz à crueldade e ao desastre. O que teria uma consequência terrível para os
djins: eles seriam novamente confinados em cavernas e ocos de árvore, porque,
com o predomínio da magia negra, os gênios teriam que se comprometer com o mal
ou desaparecer de cena.
De si mesmo, o coelhinho não era do lado escuro da força.
Mas não conseguia escapar de sua influência e ela se instalara em muitos dos
ovos. Por exemplo: os ovos que continham a tolerância, o lado escuro da força
envenenara com a permissividade. Cada vez que alguém abria um ovo desses criava
um caos localizado. Muitos caos localizados não criam um grande, mas criam
condições para que se instale um caos geral. Os ovos que continham melhoria de
vida, envenenados com ambição, atiravam o seu possuidor para qualquer ação que
lhe permitisse mais dinheiro e, então, o crime lhe ficava acessível e viável.
E, aí, como as pessoas não haviam feito nenhum esforço para alcançar os ovos,
achavam que tinham direito a mais e mais, o que criava um impasse que só a
magia poderia resolver. E não havia magia possível para tantos impasses.
Por isso os djins espalhavam as armadilhas mas o coelho, bom
saltador, evitava todas elas. E, então, nesse ano, os djins resolveram mudar de
tática. Decidiram quebrar os ovos da cesta do coelho. Era perigoso, por certo,
porque criaria um enorme tumulto quando aquela gente descobrisse que os ovos
tinham acabado. Mas, por outro lado, permitiria que as pessoas descobrissem
também a realidade em que viviam e talvez encontrassem saídas. A esperança dos
djins estava no fato de que a espécie humana sempre encontra por onde escapar
da própria destruição.
Usando sua prática no sumiço das coisas domésticas, os djins
começaram a apanhar os ovos na cesta do coelho e quebrá-los, mostrando às
claras o lado escuro da força que se instalara neles. E aí o coelho começou a
saltar para fugir da força que escapava de sua cesta e que ameaçava arrastá-lo de
vez para aqueles espaços obscuros onde ficam a estrela da morte, a bacia de
Pilatos e os grupos de extermínio.
A ação dos djins também provocou um encarecimento absurdo do
preço dos ovos de chocolate, que eram o consolo de quem não ganhava ovos do
coelhinho barbudo, fazendo com que neste ano da graça de 2014 a Páscoa reúna
muitos escândalos e medos e muito poucas compensações.
Mas como Páscoa é ressurreição e esta é uma retomada de
vida, eu desejo um ovo de esperança para todos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário