Só de ouvir, quase não acreditei. Então fui ler a íntegra dos
discursos da presidente Dilma no site oficial da Presidência. Afora algumas
pequenas correções, como trocar a ordem de citação dos senadores, eliminar “as paraensas”,
o resto está tudo lá. Dona Dilma foi à despensa da casa, reuniu o pessoal, fez
um agrado e deu as instruções.
Mais que a inépcia oratória (tenho que usar essas palavras,
não posso simplesmente dizer que ela é um desastre fazendo discurso, ficaria
grosseiro demais) o que é notável nos discursos é refletirem eles fielmente a
posição que a elite brasileira tem em relação à Amazônia. A despensa de onde tirar
a solução dos problemas, aqui e agora, não importa o custo futuro, não importa
o que pensem e o que queiram os habitantes da região.
Até mesmo a gafe recorrente, de trocar o Estado onde se
encontra – Marta Suplicy a antecedeu em
gafe igual – faz parte desse quadro. Duvido que Dilma trocasse o Paraná por
Santa Catarina. Para usar uma expressão dela, nunquinha.
Dona Dilma apresentou a hidrovia do Tocantins-Araguaia
principalmente como uma solução para desafogar os portos do Sudeste, e
destinada ao escoamento da produção de grãos do Centro-Oeste. Do ponto de vista
amazônico só conseguiu registrar a possibilidade de distribuir pela hidrovia a
produção da Zona Franca de Manaus - hoje um enclave paulistano no Amazonas - destinada
ao Sudeste, naturalmente.
Anunciou que a União está gastando pouco mais de 600 milhões
de reais no Sudeste Paraense. O grosso desse dinheiro foi aplicado em linhas de
transmissão de energia para “que a gente tenha um sistema elétrico mais robusto”.
Para quem mora nos arredores de Tucuruí e até hoje não tem luz elétrica, deve
fazer mesmo muita diferença.
Em Belém, salientou que em três anos e meio a carteira de
financiamentos para mobilidade urbana alcançou um bilhão de reais. Ela juntou
dinheiro gasto com dinheiro por gastar e deu isso. Bem, mais de um milhão de reais é
quanto a União está gastando em apenas duas das 31 ações realizadas no Rio de
Janeiro para a Copa 2014 (compra de mobiliário para o Maracanã, 660 mil; e
instalação de elevadores no Galeão, 477 mil). Só nos BRTs do Rio de Janeiro
(são dois) são mais 1,2 bilhão de reais.... Os dados são do Portal de Acompanhamento
de Gastos da Copa 2014, que traz todas as licitações realizadas.
O pessoal da despensa até agradece a lembrança e o agrado,
este conseguido depois de um longo e penoso percurso de gabinetes e salas de
espera, discussões e pressões, um movimento paraense que reuniu todos os
partidos e todos os políticos. Todavia não consegue esquecer que o salão usa a
despensa quando bem entende e assim o quer, e se dá uma coisa, toma o dobro. Adoça
a boca para obrigar a engolir o amargo.
Mas não culpem apenas a dona Dilma, se ela não conhece
direito a despensa: o salão é exigente e os cortesãos, absorventes. Como é que
ela vai ter tempo de olhar essas miudezas? Afinal, a gente só entra na despensa
quando precisa desesperadamente de alguma coisa de lá, tipo resolver o sufoco
de Santos ou contornar a crise do setor elétrico; fora isso, basta mandar os
mordomos...
3 comentários:
A Amazônia sempre foi a "despensa" em todos os governos da história. Como vivemos, apesar de tudo, numa democracia a única forma de mudar de rumo é eleger um governante mais de acordo com nossos interesses. No Pará e aqui no Amazonas o que temos? A velha oligarquia - como sempre - comandando o espetáculo e o povo abestalhado apreciando. Quem sabe o Aécio Neves? Que sabe o pernambucano Eduardo? Cada uma faz sua opção,.. Colocando o ressentimento de lado.
Olá Sra. Aline, como estão todos?
É sempre com alegria que recebo seus e-mails.
Adorei a coluna de sua conterrânea, jornalista Ana Diniz.
Recomendações a todos.
José.
Adorei este texto. Tomei conhecimento dele no blog do Parsifal recortei e coloquei no meu face...Parabéns..é necessário e muito defender esta possibilidade de algo novo neste planeta.. que é o que a Amazônia representa.
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