domingo, 18 de maio de 2014

Uma copa sai da cartola


Pão e circo, diziam os romanos, acalmam a plebe. Mas eles mesmos concluíram que nem sempre, e tiveram que impor a paz romana, uma variedade de paz que consistia, simplesmente, em matar os revoltosos e descontentes.

O governo tira o circo – ops, a copa! – da cartola esportiva. Isto acalmará a plebe?

Os experientes romanos sabiam que acalmaria, sim – mas só enquanto o espetáculo durasse. Por isso dispunham suas legiões com estratégia: para os veteranos da campanha da Gália, Júlio César deu terras em torno de Roma. Assim, premiando, ele montou um círculo de ferro em torno da cidade. Se os ex-legionários foram capazes de produzir trigo e vinho, não sei; mas Roma sob Júlio nunca se revoltou.

A copa está chegando mas quase todos os brasileiros vão ver os jogos do mesmo jeito que viram nas últimas copas: pela tevê. Uns poucos irão aos estádios, cercados por policiais na ida e na volta. Dilma, Blatter e todos os outros serão vaiados. Nada contra, não, senhor: pura farra.  As plateias serão brasileiras, porque a grande promessa turística de um evento desta magnitude deu chabu. Há uma companhia aérea na Europa que está oferecendo passagens para o Brasil na copa com 70% de desconto! Os ingressos vendidos na Europa estão sendo revendidos aqui mesmo, como mostrado na tevê. E eu me pergunto quem é que tem dinheiro para comprar um ingresso por três mil reais... ou melhor, me pergunto se o dinheiro que compra um ingresso por três mil reais é legítimo.

É uma copa escandalosa, essa, que sai da cartola esportiva. Um coelho dourado devorador de dinheiro. O Brasil espera 600 mil turistas, me informa o Financial Times de Nova Iorque. Se cada um deles gastar no Brasil dois mil reais, teremos uma entrada de receita de 1,2 bilhão – muito, muito menos do que já se gastou para recebê-los.

E o maior legado da copa são os grandes circos – ops, estádios! – onde não pisarão, por certo, nossos humildes clubes de futebol, mesmo que se reconheça que são eles que sustentam a paixão brasileira pelo jogo. Ah, se esse dinheiro dos gigantescos estádios fosse aplicado em pequenos estádios nos municípios, o quanto poderíamos avançar no esporte!

Mas o que mais me impressiona é a espécie de apatia que tomou conta do país nesta fase, em que pese os esforços das televisões e seus anunciantes. Apatia não só em relação à copa mas, também, em torno das festas juninas. Meados de maio e os estoques estão encalhados. Da copa e do caipira.  O termômetro da animação está baixo.

São os protestos? Penso que talvez tenham alguma coisa a ver, mas o que vejo na população é cansaço, exasperação, uma inquietação irritada e intolerante. E me pergunto: quando o coelho voltar para a cartola o circo terá acalmado a plebe?


Um comentário:

Anônimo disse...

O desânimo com a Copa e com as festas juninas tem um nome:

INFLAÇÃO.

Como uma depressão a qual pensou-se curada, mas com a mudança do remédio, voltou; daí o paciente fica cansado, exasperado, irritado e intolerante porque descrente do remédio - no caso, do placebo - enfiado goela abaixo.

Pior o médico fazer firula, comprar bandeirinha e mostrar os novos aposentos da clínica, que o paciente não é burro e conclui que foi ele que pagou, em benefício dos outros. Ou seja, ele não é burro, mas se sente como tal porque descobre o engodo, a vigarice e falsidade do dotô.

Qual deprimido que saber de festa?

No máximo, pela televisão.