Na História do Brasil há vários momentos como esse que
estamos vendo nascer agora: uma liderança se projeta e encarna a utopia; a utopia de cada um de repente toma corpo e palanque. Aí a
urna vira cartola de mágico: é como se todas as mazelas ficassem curadas de uma
só vez.
Aprendizes de mágico sabem como fazer um coelho sair da
cartola e a população sabe, perfeitamente bem, que não passa de um truque. No
entanto deixa-se envolver pela magia do momento e, a cada vez, se maravilha.
Mas os mágicos não farão o número se não dispuserem de um coelho real, de carne
e osso, bem treinado e escondido no fundo falso da cartola.
Com as urnas não há coelho escondido: elas se esgotam com o
último registro. Mas a magia da utopia enleva e crer é melhor que descrer. Até
o dia seguinte, sob as luzes da realidade que permitirão distinguir-se o falso
do verdadeiro.
Esses momentos cívicos são bonitos. A população fecha os
olhos e salta no escuro, confiante nas luzes do arco-íris no fundo da
cachoeira. Pena que sejam apenas reflexos prismáticos: o pote de ouro não
estará lá.
Mas haverá, talvez, diamantes no fundo do rio? Ou apenas pedras? No
complexo social, não há drones para saber o que se passa. Há que conferir
pessoalmente.
A pré-eleição não é animadora. Esgotada a geração das
diretas, o conjunto que a substitui está a quilômetros abaixo dela, em qualidade
e coragem. Não há estadistas, há negociantes. Renan Calheiros e Ricardo
Levandovisky acabam de montar uma armadilha para o próximo presidente, seja
qual for: 34% de reajuste para o Judiciário, o início de uma corredeira que
pode atirar o país num poço bem longe da cachoeira e de seu arco-íris. Para
deter essa corredeira, há que pagar o preço de uma crise institucional. O
primeiro passo do novo presidente será uma barganha com os dois outros Poderes.
A plataforma dos três candidatos com maior intenção de votos
é conservadora, banqueira e populista. Está longe, muito longe, de responder à
voz rouca das ruas do Sudeste/Sul, e sequer ouve as tímidas vozes do Norte. A
montanha russa da política brasileira pode fazer um looping nesta eleição –
mas, a menos que o carrinho saia dos trilhos e se despedace, vai continuar o
percurso descendente desta fase.
Ou seja: o salto não é tão no escuro assim. Com sorte, dá
para alcançar uma laje segura que sirva de degrau.
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