O Congresso é a cara do Brasil. É ele que espelha, física e
moralmente, o Brasil profundo, do litoral, do sertão e das cidades. Especialistas
políticos caracterizaram o Congresso que iniciou suas sessões ontem como de
centro-direita, com o avanço de das bancadas religiosas e da chamada bancada da
bala.
E esse Brasil mostrou a sua cara, ontem, ao eleger Eduardo
Cunha.
Infelizmente, não é a cara que eu gostaria de ver.
A cara que vejo hoje é enrugada por práticas corruptas,
hidratada pelos panos quentes postos sobre os escândalos, maquiada pelo
marketing irresponsável, enfeitada com ouro de tolo e com o olhar esquivo dos
trapaceiros.
Ontem, o Brasil estendeu um tapete para tentar esconder o
lixo.
Mas o Congresso se esqueceu que o lixo fede. A podridão se
impõe para muito além do ponto onde ocorre. E quando o lixo é muito, e é
antigo, faz escorrer chorume. O chorume contamina tudo o que toca, terra e
água. E também tapetes.
Na semana passada um título de jornal ilustrou essa
contaminação: dizia que o desvio na Petrobrás sustentaria o programa bolsa-família
por uma década. A leitura subliminar dessa manchete é a seguinte: esse dinheiro
que está no bolso deles devia estar no meu. O chorume toca, aqui, o
inconsciente coletivo.
Cunha não fará oposição – aliás, ele declarou isso sem
subterfúgios – e sim, lado a lado com Renan Calheiros e Michel Temer, a
acomodação dos fichas sujas, sejam eles de que partido forem. Esse foi o pano
de fundo que garantiu sua eleição. O site “Congresso em Foco” informa que essa
é a bancada mais numerosa do Congresso. Em 2012, era composta por 191 deputados
ou senadores. Nas últimas eleições saíram 34 deputados e entraram 40 com
processos, em sua maioria por corrupção. Esse contingente de deputados
representa 18% da Câmara. Entre eles está o próprio Eduardo Cunha. E entre eles
não estão (ainda) os envolvidos nos desmandos da Petrobrás.
No entanto, precisamos ter esperança. Num artigo publicado
neste domingo passado, Fernando Henrique coloca as suas no Judiciário. Em outro
artigo, despedindo-se da política partidária, José Sarney apela para a pressão
suprapartidária, a fim de evitar males maiores para o Maranhão. Lula, em vídeo
circulante na internet, grita pela mobilização do PT. Os três ex-presidentes, de
posições tão diferentes entre si, manifestam simultaneamente extrema
preocupação com o momento nacional.
Mas, para os parlamentares eleitores de Eduardo Cunha, que
reivindicam aumento das mordomias e das respectivas remunerações, a preocupação
parece ser somente a que mobiliza hoje o Brasil profundo: que fantasias usarão
daqui a duas semanas, no Carnaval.
Porque as fantasias de palhaço já têm donos: somos nós.
Um comentário:
E a cada dia que passa, mais imundície vem a tona. É um lodaçal tão grande que saiu das fronteiras e foi para outros continentes. Deus queira que nessas outras fronteiras o alarme funcione direito porque por aqui, o congresso é de uma surdez espantosa.
Postar um comentário