Nesta sexta, 13, um chinês foi preso transportando 300 mil na cueca.
O que me fez lembrar o outro dinheiro na cueca – aquele do PT, e perguntar: em que deu aquilo tudo?
Foi em 2005. Três anos depois, foi preso um dos réus no caso do mensalão, também com dinheiro na cueca. Logo depois, um traficante com mais de um milhão. Em seguida, um sequestrador, que trazia as notas marcadas de um resgate – 14 mil. Agora, esse chinês, que ninguém sabe direito porque tinha a cueca cheia de grana.
Exceto o último, todos foram denunciados pelo Ministério Público Federal.
Em 2007 uma comissão do Congresso aprovava emenda à lei contra a lavagem do dinheiro enquadrando o dinheiro na cueca como crime.
Dei uma busca: todos os processos ainda se encontram em primeira instância, nenhum foi julgado. Os recursos sobem e descem dos tribunais, apenas para que se comece o julgamento.
Pois bem. Transcrevo uma das informações que encontrei:
“Uma empresa especializada em material de defesa/espionagem colocou no mercado a “Brief Safe”, uma cueca com bolso de velcro e “marcas de freiada” pré-impressas. O objetivo é guardar seus bens mais valiosos (se bem que isso toda cueca faz) à vista de todos.” O lançamento é de 2007. A empresa é a Shomer Tec., que vende, também, uma caneta de tinta fantasma com selo da KGB. Cada cueca custa 11 dólares.
É fácil culpar o Judiciário e o sistema de recursos e contra-recursos que eterniza os processos civis ou penais brasileiros. Mas a questão fundamental é outra: todos se queixam do Judiciário mas ninguém faz nada para consertar o estrago.
Porque a sociedade não quer, nem o Estado. Um sociólogo ou um economista poderiam explicar essa situação como característica de países emergentes: o dinheiro ilegal pesa muito no PIB para ter um combate sério. É como a questão dos temporários: se os parafusos forem apertados demais, a máquina explode.
Eu me consolo lendo algumas coisas antigas. No momento, a história dos bucaneiros do Caribe, no século XVII. A descrição das condições de vida dos colonizadores ilhéus (Cuba, Tortuga, Trinidad, Tobago, Hispaniola – hoje Haiti e República Dominicana) é de arrepiar. Mas o que mais me chama atenção é a existência de investidores por detrás dos capitães piratas, e governadores que investiam no ramo ou compravam, para revender, produtos de saque. Àquela época, não havia cueca que comportasse o dinheiro – era todo em moedas, e a própria cueca ainda não existia – e, talvez por isso, a forma de desviar a prata real era muito mais violenta.
As coisas se suavizaram em meio milênio – pelo menos podemos nos proteger em casa, e não no oco de árvores.
Mas as ameaças continuam as mesmas: a penúria ainda é um fantasma persistente, já não mais na forma de navios com caveiras e ossos cruzados, mas agora em forma de assinaturas eletrônicas. Não se morre com freqüência de exaustão física, mas, agora, de exaustão moral: o suicídio já é, no Brasil, a terceira maior causa de morte de jovens, perdendo apenas para os homicídios e acidentes de trânsito.
A sensação que tenho é que navegamos muito – ciência, tecnologia, medicina de massa – mas o fundamental, que é o respeito mútuo, ainda está tão atrasado como antes.
E as cuecas testemunham isso.
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