quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Segunda adolescência

Aos sessenta anos, descubro que entrei numa segunda adolescência. Adolescência às avessas, é verdade, mas, de repente, retornaram todas aquelas questões que perturbam o início da vida adulta.

Só que, na primeira adolescência, você ainda não pode. Na segunda, você não pode mais.

Olhar-se no espelho. O que vejo no espelho não é, absolutamente, como me sinto. Exatamente como uma adolescente, que jamais está satisfeita com o que encontra no espelho que não reflete o que vai por dentro. Aos 16, você encara o cabelo hor-rí-vel – exatamente como aos 61. A pele – ah!, meu Deus, espinha! diz a de 16. E a de 61: “Essas manchas!” . Em ambos os casos, não tem maquiagem que dê jeito, resta sair com a sensação de que todo mundo vai reparar.

A roupa nunca serve. Para a de 16, adulta em excesso; para a de 61, jovem demais. As queridas saias e blusas de repente se tornam objeto de olhares significativos. Você sente que errou, mas não sabe aonde. Acaba perguntando e ouvindo a mesmíssima resposta: “Essa roupa é um pouco inadequada, não?”

Você se sente deslocada, com ondas de insegurança, aos 16 e aos 61. Frequentemente cobram de você um comportamento padrão – que, aos 16, você ainda não alcançou, e, aos 61, você não dá conta mais. Você muda de gostos – aos 16, porque quer experimentar o mundo, aos 61 porque não aguenta mais aquela preferência – e todo mundo estranha: “Mas o que há com você?”

Ora, o que há! É que sou e não sou, do mesmo jeito que um adolescente é e não é. Estou vivendo um lusco-fusco: só que agora não é aurora, é ocaso.

Passei a ouvir uma frase que esquecera há muito: “Mas você não tem idade para fazer isso!” Muda apenas o advérbio: na primeira adolescência, entre o “tem” e o “idade” acontece um “ainda”. Na segunda adolescência, um “mais”. O resultado é o mesmo: um limite, uma indefinição, uma época de cores mal definidas, de luz e sombras.

Você toma uma dose de qualquer coisa e, instantaneamente, exatamente como aos 16, enfrenta um olhar de advertência. Aos 16, geralmente de alguém mais velho; aos 61, de alguém mais novo. Mas é o mesmo olhar.

Apaixonar-se é um problema. Adolescentes se apaixonam pela paixão, amam o amor, por assim dizer. Desconfio, pelo que tenho visto por aí, que mulheres de 60 também. Uma de 16 ouvirá: “Mas ele é velho demais para você!”. Uma de 61: “Mas ele é novo demais para você!”. O que, traduzido, quer dizer: inadequado, inadequado.

O sentimento de incompreensão é forte aos 16, como aos 61. As múltiplas restrições não casam com a disposição de ânimo. Você se machuca à toa com as boas intenções alheias. A diferença é que, aos 61, você sabe que as pessoas são bem intencionadas, e que geralmente têm razão. Aos 16, você bate numa muralha. Mas eu não consegui avaliar o que é pior.

Até porque na primeira adolescência, você pode tudo; e, na segunda, o que você pode é tudo o que tem.

2 comentários:

Bia disse...

Ai..ai... somos mesmo é muito inadequadas...rsrsrs..

Beijão.

Jornalista disse...

tá!