segunda-feira, 24 de junho de 2013
O pastor e o nazista
Quando a política confronta a ciência todos perdem. Da mesma maneira, todos perdem quando o fanatismo confronta a razão.
São Paulo escreveu que “ainda quando tivesse a fé possível, até o ponto de transportar montanhas, se não tiver caridade, nada sou”. A fé sem caridade resulta no fanatismo, que já gerou padres inquisidores e aiatolás sanguinários.
Eles se baseiam em livros considerados santos para impor suas próprias ideias, ou as ideias de uma determinada corrente de pensamento. Assim é com o criacionismo: a interpretação literal do Gênesis nega toda a ciência moderna.
O curioso é que estes fanáticos não sobrevivem sem essa ciência que negam. Eles gritam contra o bezerro de ouro e investem no mercado financeiro; vestem-se com fios tecidos em teares eletrônicos e tingidos pela indústria química; e reagirão se alguém usar o exposto no livro dos Levíticos para isolar pessoas com manchas brancas na pele, principalmente se a pele for a deles.
O pastor é contra o relacionamento gay; tudo bem. Religiosos, de um modo geral, o são. Mas, na maioria destes, a caridade tempera a fé e eles respeitam o livre arbítrio, aquele dom que, segundo a Bíblia, Deus concedeu aos humanos.
Mas o pastor quer impor seu ponto de vista a toda uma sociedade. Ele segue exemplos diferentes daqueles ensinados pelos apóstolos. Ele está simplesmente replicando uma das fórmulas do totalitarismo, em que a condenação aos gays foi um dos aspectos da violência ideológica.
Os resumos históricos nos contam que Stálin, o maior ditador soviético, introduziu em 1933 o crime de homossexualismo no Código Penal, com pena de cinco anos de prisão com trabalhos forçados. Nesse mesmo ano, Hitler e o partido nazista declararam os gays como criminosos de Estado. Antes deles, a inquisição considerava o homossexualismo o mais torpe dos pecados. E matava, como Hitler e Stálin depois.
Mas há um detalhe importante nessa história de perseguição aos gays. Os nazistas consideravam que o homossexualismo era uma doença. Ela degenerava a raça ariana, e, por isso, gays deveriam curar-se, submetendo-se a um tratamento de conformidade sexual e social. Manter-se gay era atentar contra o Estado.
É isso mesmo. O pastor está repetindo o que disse, há oitenta anos, Himmler, o temido chefe das SS nazistas, o homem que coordenou o Holocausto: que o homossexualismo é uma doença.
O pastor fala em nome da religião, Himmler, em favor da pureza da raça. Ambos têm um ponto em comum: são fanáticos.
O fanatismo de um condenou à morte nos campos de concentração mais de 15 mil alemães. O fanatismo do outro está batendo à nossa porta. Se permitirmos que entre, será muito difícil expulsá-lo depois.
As repúblicas soviéticas levaram 50 anos para remover as leis homofóbicas de Stálin, que só caíram duas décadas depois de dissolvida a URSS. Muitos dos gays alemães presos nos campos de concentração foram presos de novo depois de terminada a guerra, para cumprir o restante da pena a que haviam sido condenados. E foi somente nos anos 1980, quarenta depois da guerra, que a situação se normalizou na Alemanha.
A proposta do fanático pastor pode parecer ridícula e se prestar a muito riso. Mas é perigosa. E é preciso impedi-la, porque é a primeira pedra de um triste edifício social.
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2 comentários:
Grata surpresa esse blog! Já li tudo. Ana Diniz, você não tem mais o direito de parar... rsrsr
É impressionante como a história se repete!
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