terça-feira, 2 de outubro de 2007

Deu a doida no homem!

Como é que se demite o gerúndio?

O governador do Distrito Federal acha que é por decreto. Esse decreto saiu publicado ontem. Ele não proibiu de usar o tempo do verbo, presente em todas as placas de obras (“Estamos trabalhando”), ele demitiu.

Bem, o gerúndio nunca fez concurso para o serviço público; era temporário, pois: foi-se chegando, chegando (olha ele aí!) e pronto, abancou-se. Agora o governador lhe mostra a porta da rua, pronto! Agora, é tudo ou nada: ou faz, ou fez, ou fará. Assim, como por milagre – tudo andando, nada em andamento.

O corolário desse decreto é curioso: as pessoas terão que usar o pronome “nós”, que andava arredio dos arraiais públicos. O problema é que há verbos em que a palavra é a mesma para o presente e para o passado. O verbo construir, por exemplo: nós construímos no presente, e nós construímos no passado. Foi por essa brecha que o gerúndio entrou, e como ninguém construiu ponte na brecha, ela continua esperando os incautos da linguagem erudita.

Diz o governador que não admite o uso do gerúndio para desculpar a ineficiência. Perdoe-me ele entrar na seara, mas a ineficiência é produto da incompetência, e não do pobre do gerúndio. Punir o gerúndio é o mesmo que chicotear o servo pelo erro do senhor, coisa que os nobres medievais praticavam sempre. O governador não é nobre nem estamos na Idade Média: demita ele o incompetente, mas deixe o gerúndio em paz.

Seria aliás mais producente que, em vez do gerúndio, ele demitisse o ao-ao. Ao-ao é como se denomina a trilha infindável da burocracia preguiçosa: “Ao fulano, para opinar”; “Ao chefe, para despachar”; “Ao beltrano, para consertar”; “Ao chefe maior, para avaliar”; “Ao cicrano, para considerar”; “Ao chefe menor, para informar”; o cidadão, ou sua petição, vai percorrendo o “ao-ao”. Cansa, desiste, e finalmente vem o despacho definitivo: “Ao arquivo, por desinteresse do requerente”. Às vezes, o desinteresse é justo: o requerente já se finou.

Eliminar o ao-ao é que mereceria foguetório. Ou pelo menos reduzir a quantidade, encurtar a trilha, decidir mais depressa. Mas no ao-ao não existe gerúndio: os verbos são todos no infinitivo. Assim, não incomodam o governador.

Mas governadores também precisam de gerúndio, e ele será o primeiro a sentir falta do parceiro. O gerúndio permite ganhar tempo na solução de crises, principalmente as políticas ou aquelas que envolvem pedidos absurdos feitos por prefeitos ou parlamentares. Sem ele, o governador terá que decidir na lata. E a lata, às vezes, é cheia de votos que não gostam de ser contrariados...

Um comentário:

Anônimo disse...

Depois desse texto estou seriamente pensando em me caditar a "Gerúndio" nas próximas eleições.