Um parlamentar alemão, irritado com a quantidade de cocô de cachorro encontrada diariamente na rua, apresentou uma proposta de lei radical: a formação de um banco de DNA canino, obrigatório, de forma a permitir que se identifique o dono do cocô – e, por aí, o dono do dono do cocô, para que este último pague uma pesada multa.
Complicado? Nem tanto, quando se tem dinheiro bastante para fazer exame de DNA de cocô de cachorro. O que chateia é que, por aqui, milhares de crianças aguardam exames de DNA para conhecer o próprio pai – e não há dinheiro bastante para fazer o exame. A distância dos dois mundos permite isto; e, como indicador de concentração mundial de renda, este contraste no âmbito do DNA parece ser suficiente.
O projeto não passou até agora, e não foi porque pensasse a sociedade que ele custa caro; foi porque os alemães estão achando que um banco de DNA canino e a identificação do cocô uma intolerável invasão de privacidade – e que, quando se começa a invadir a privacidade de bicho está próxima a invasão da privacidade humana.
Convenhamos, ainda, que é um certo consolo – negativo, está bem, mas assim mesmo consolo – descobrir que a civilizadíssima Alemanha não consegue fazer com que seus cidadãos evitem o cocô das ruas só por ser uma questão de civilidade. Que é preciso um bocado de repressão para que as ruas fiquem limpas dessas cacas anônimas. Eu reclamo do que encontro nas ruas daqui; percebo que o cachorro e seu cocô é drama também entre os povos mais adiantados.
Talvez se ensinássemos os cachorros a enterrar o cocô? Ou, melhor ainda, se eles já nascessem sabendo? Para isso, haveria que isolar o DNA correspondente nos gatos e transplantá-lo para os cachorros. Cães transgênicos, naturalmente – mas com as cidades limpas de dejetos. Mas seriam os cães transgênicos os mesmos que amamos? Os verdes dizem que não – pelo menos quanto à soja e outros produtos da terra. Mas o novo princípio, oriundo diretamente do avanço tecnológico, é: mude-se tudo a qualquer preço, desde que não mudemos nós.
Uma civilização epicurista, desabituada da paciência de construir, do esforço penoso de colocar pedra sobre pedra, literal ou figuradamente? Por enquanto, os alemães discutem o banco de genes caninos, e, nessa discussão, os limites de controle do Estado sobre os cidadãos. O cocô de cachorro ganhou matizes ideológicos, ora pois, quem diria?! E, ao que parece, o projeto do deputado não passará. Ele terá que arranjar outra maneira de conseguir que os donos de cães recolham o cocô das ruas, ou, então, talvez criar uma taxa canina para manter os serviços de limpeza e construir espaços especiais para o alívio dos cachorros.
Quanto aos donos, não estão nem aí. Como aqui.
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Um comentário:
Ana: Cocô de cachorro pode ser uma boa maneira de margear a expressão civilizatória de um povo. Para quê usar sinfônicas e filarmônicas? O melhor mesmo é usar excremento de cão, né não?
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